- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

Da reforma policial

Todos os estudiosos da matéria, em todo o mundo, têm realçado em suas importantes obras o papel de destaque ocupado pela Polícia na área do Direito Penal.

Jeschek, o grande mestre alemão, chega ao ponto de dizer que praticamente quem faz Direito Penal é a Polícia, porque o que ela realiza na prevenção e repressão ao crime representa pelo menos oitenta por cento do trabalho total a ser executado.

E, realmente, não há dúvida: quem é que mantém o primeiro contato com o crime e o criminoso? A quem incumbe coletar as provas? Quem fornecerá à Justiça os elementos de convicção sobre os fatos, trazendo luzes acerca da personalidade do delinqüente, seus antecedentes, sua periculosidade? Quem investigará os motivos do crime? Quem dará ao julgador dados necessários, essenciais, fundamentais à apuração da verdade? Só pode ser a Polícia.

Se a Polícia se baseia em suposições e indícios errados, prende inocentes e apresenta provas mal feitas, confusas e contraditórias, é mais do que certo que um processo baseado num inquérito instruído dessa forma produzirá resultados desastrosos.

Por outro lado, quando o inquérito é elaborado de maneira conscienciosa, criteriosamente, o Judiciário tem em mãos instrumentos bastante eficazes para oferecer a verdadeira Justiça.

O espaço dentro do qual o Judiciário pode fazer sentir os efeitos de sua atuação é, sem dúvida alguma, bastante limitado. Encontra-se limitado, desde logo, pelo fato de que os casos que chegam ante o Juiz para que este dê uma decisão sobre os mesmos, representam o resultado de uma fase em que já se verificou um processo de seleção.

Antes mesmo do Ministério Público, a Polícia faz o primeiro papel seletivo. Investiga e apura o que acha que seja crime; recebe as queixas e as notícias do crime.

Levantamento publicado pela imprensa, recentemente, registra que de 1OO queixas submetidas à Polícia no Rio de janeiro, apenas cerca de 7 vão ao conhecimento do Judiciário.

A Polícia é o braço armado do Estado para o combate ao crime. Por isso ela dispõe de instrumentos poderosos, postos à sua disposição para ação imediata. Se esses formidáveis recursos que lhe estão confiados forem utilizados com bom senso, equilíbrio e numa direção sadia, a sociedade estará tranqüila. Mas, se forem desviados e empregados para o arbítrio, a opressão, a prepotência, ocasionarão efeitos negativos, e ao invés de combater, incentivarão o crime, difundindo-o e estimulando-o, pelos exemplos de arrogância, violência e arbitrariedade, criando revoltados e desajustados da pior espécie.

Diz muito bem José Antonio Barreiros que “uma história da Polícia, que efetivamente, ainda está por fazer permitiria analisar as inter-relações desta entidade e do poder político, verificar em que medida, destinada à salvaguarda da ordem de uma determinada comunidade, interiorizando e tutelando os valores sociais de cada momento histórico a Polícia vem, freqüentemente, colocando questões de posicionamento dentro da estrutura do Estado, por se apresentar, não poucas vezes, como um autentico Estado dentro do Estado.”

O inquérito policial, a rigor, não faz parte do Código de Processo Penal, nem tampouco do processo penal. As disposições genéricas constantes do Código a seu respeito, não visam a regulá-lo e disciplinar o funcionamento, mas, especificamente, a evitar abusos, excessos e arbitrariedades assegurando as liberdades e garantias individuais.

A sociedade tem o máximo interesse na apuração do crime e sua repressão. Por isso, a autoridade policial está investida de poderes amplos e gerais nos seus trabalhos de investigação.

Esta fase processual remonta aos vestígios do chamado “sistema acusatório”, quando o processo penal concentrava-se nas mãos de um Juiz acusador, inquiridor, selecionador de provas, lutando por todos os meios e modos em busca da verdade, sem peias nem limites.

O agente da autoridade, representando o poder do Estado, ao exercer o poder de polícia, dispõe de armas, pessoal adestrado e preparado, veículos, instrumentos hábeis, material e capacidade para o uso da força, se necessário e se achar conveniente.

Por isso e por muito mais que se vê e sente no dia a dia da importante instituição, chega a nos causar muita apreensão quando vemos e ouvimos a toda hora falar-se em reforma da Polícia, visando-se apenas a enfraquecê-la, acabar com o inquérito policial e tantos outros modismos.