- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

Das leis

Os criminologistas apontam vários fatores que ocasionam o crime, dividindo-os em causas endógenas e exógenas. Endógenas seriam aquelas causas pertencentes ao agente do crime (excitação, personalidade violenta, complexos, psicoses, etc.) e exógenas, as que vêm do mundo exterior: fenômenos sociais, políticos, econômicos, religiosos, etc.

Dentre os fenômenos exógenos, surgem as Leis. Com efeito, está mais do que provado pela experiência histórica que leis erradas, mal feitas, injustas, em vez de combaterem a criminalidade, estimulam-na, elevam-na, colocando-a em patamares muitas vezes insuportáveis.

O exemplo mais patente disso temos na chamada “Lei Seca”, nos Estados Unidos.

Religiosos fanáticos, imbuídos, sem dúvida alguma, das melhores intenções, conseguiram que o Congresso aprovasse uma Lei proibindo a fabricação, comercialização e o consumo de álcool. Iniciou-se, em todo País, implacável perseguição aos fabricantes e consumidores de cerveja, uisque, martini, etc. Não se liberou sequer o vinho, bebida que, segundo a Bíblia, teria sido aprovada por N. Sr. Jesus Cristo, quando, para facilitar seus consumidores, transformou a água em vinho, nas bodas de Caná.

Foi aí que a criminalidade disparou, atingindo níveis inimagináveis. Exatamente nessa época surgiram as figuras lendárias de Al Capone, Lucky Luciano e tantos outros chefes de quadrilhas famosos, que corrompiam policiais, juízes, membros do Ministério Público, da Imprensa, e até mesmo políticos e Chefes de Governo federal, estaduais e municipais. As lutas de gangues, guerras de quadrilhas contra elas mesmas e enfrentando Policiais à mão armada, até hoje estão registradas na literatura e representadas em milhares de filmes.

Passados alguns anos, vendo que a Lei havia produzido efeitos exatamente contrários aos pretendidos, o Congresso aprovou uma outra, revogando-a.

Efetivamente, a Lei quando justa, equilibrada e consentânea com a realidade, combate o crime; quando exagerada, confusa e afastada da lógica social, aumenta a taxa de criminalidade.

Por exemplo: se o Governo taxa inadequadamente determinados produtos, criando uma grande diferença entre o preço praticado no exterior e o vigente no País, estimula o contrabando. Se cria muitos impostos e a níveis que ultrapassam a capacidade tributária do contribuinte, aumenta a sonegação fiscal.

Temos, no Brasil atual, dois casos que evidenciam a enormidade de nossas Leis. Dois condenados a mais de 24 anos – José Rainha e Nahas – acham-se soltos e têm o direito de permanecerem soltos até o julgamento de seus recursos aos Tribunais Superiores – que não se sabe quando ocorrerão. Um, acusado de crime de homicídio, e o outro, pelo chamado “crime do colarinho branco”.

Enquanto isso o modesto homem do interior, simples lavrador, que matar um sarué, uma preguiça ou um tatu, tem que permanecer preso, porque seu crime é inafiançável, não dá direito à liberdade provisória, nem tampouco a permanecer livre durante o julgamento de seus recursos.

O pequeno “avião” ou vendedor de um ou dois cigarros de maconha merece a mesma pena que um grande traficante, que negocia toneladas de cocaína: ambos terão que permanecer presos, em regime fechado, até o término de sua condenação, sem direito sequer a livramento condicional. A Lei coloca ambos no mesmo patamar.

Não é preciso muita cultura, nem sequer conhecimentos de criminologia e penologia para se compreender desde logo que a Lei, no Brasil, vem incentivando e estimulando o crime.

Efetivamente, o cidadão quando é jogado injustamente no fundo de uma cadeia, ora por suspeita dum crime que não cometeu, ora por fato de somenos importância, ora porque não pagou uma prestação à financeira, sai de lá revoltado, indignado, com raiva da sociedade, pronto para, doravante, cometer, de fato, “crimes”, no sentido exato da palavra, pois, se for preso, “estará com a consciência tranquila”, porque está recebendo “o que merece”.

Lamentavelmente, este é o quadro atual no nosso País, em que, como dizia o Padre Antonio Vieira, “os delitos têm carta de alforria, e os merecimentos andam homiziados”.