- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

Evolução dos tempos

Recentemente noticiou a imprensa, um fato muito interessante ocorrido na Argentina: o juiz Héctor Ramos foi preso bêbado num motel de Buenos Aires. Ramos, que estava no local com uma jovem não identificada, agrediu funcionários do motel com uma garrafa de champanhe e desacatou os policiais, ameaçando fazer com que fossem transferidos para a Terra do Fogo. O juiz será julgado pelo Congresso argentino e deverá ser afastado. Para piorar ainda mais a situação, sua mulher o expulsou de casa e as más linguas comentam que a jovem com quem o juiz estava era um travesti.

E, mais ainda: num debate sobre uma possível reforma da Justiça, a França mostra-se descrente em relação à instituição no próprio país. Segundo pesquisa do jornal “Le Figaro”, 62 por cento dos entrevistados pensam que a Justiça funciona mal ou muito mal. Para setenta por cento, ela é ineficaz em matéria de política e corrupção, e funciona melhor em questões de família.

Aliás, já dizia Voltaire, que “a história dos grandes acontecimentos do mundo não é mais do que a história dos seus crimes”.

Como se vê e se conclui o problema da criminalidade e da ineficiência dos instrumentos de combate, não é privilégio do nosso País.

Aqui vivemos com um dispositivo de segurança enorme, dispendioso e mal remunerado. Há segurança no país, todavia não veio seguridade, e segurança e seguridade não são a mesma coisa; a segurança é relativamente à atualidade, é material; a seguridade é do futuro, é moral, é a ausência de receios.

A sociedade sem delinquência. Com isso se sonhou no final do século 18. E depois, imediatamente, o fracasso. A delinquência era demasiado útil para que se pudesse sonhar com algo tão louco e tão perigoso como uma sociedade sem deliquência. Sem delinquência não há polícia. O que torna tolerável a presença da polícia, o controle policial sobre uma população, senão o medo do deliquente? Esta instituição, tão recente e tão pesada, da polícia, não se justifica senão por isto. Aceitamos entre nós, com toda humildade, essas pessoas de uniforme, armadas, enquanto não temos o direito de estar da mesma forma, que nos pedem documentos, que rondam diante de nossa porta. Como seria possível, se não houvesse delinquentes? E se não saíssem todos os dias notícias nos jornais que nos relatam que os delinquentes são muitos e perigosos?

Os sociólogos distinguem quatro tipos de sociedades segundo o tipo de castigo que, historicamente, adotaram: sociedades de desterro (sociedade grega), sociedades de redenção (sociedades germânicas), sociedades de marcar a ferro (sociedades ocidentais no final da Idade Média), e sociedades de prisão (sociedades ocidentais a partir do final do século 18).

A Polícia fica dotada de poderes de investigação dirigidos a produzir provas para apurar fatos certos, sejam eles praticados por organismos ou funcionários públicos ou mesmo por particulares. Tem por objetivo alcançar o melhor exercício das funções constitucionais, por isso os limites de sua atuação estão estabelecidos na Lei Maior.

De fato, tudo que envolve o crime, o criminoso e a pena não se acha apenas no Código Penal, mas também, e principalmente, na Constituição.

Não se trata, portanto, de se melhorar e ampliar a legislação. A esse respeito, bem adequadas são as palavras de Carnelutti, quando diz:

“Ir até os réus é a solução do problema. Não fugir deles; mas correr a seu encontro, como São Francisco. Não mirá-los de cima para baixo, mas descer do cavalo e adaptar-se a eles, como São Francisco. Não fixar os olhos em sua deformidade; mas afastar a vista, como São Francisco. Não tapar a cara, por temer o contágio; mas beijar-lhes na cara, como São Francisco. Não detestá-los como inimigos, não dar-lhes chibatadas como a cachorros, não pôr-lhes ao pescoço a campainha do leproso. Sua enfermidade não é mais do que fome e sede, frio e solidão. O alimento, para tirar-lhes a fome, a água, para tirar-lhes a sede, o tecido, para vesti-los de novo, a casa , para alojá-los, é nosso amor. O antídoto contra o mal é o bem. E esta medicina milagrosa não é daquelas que os homens devam buscar com fadiga ou pagar a peso de ouro; não é necessário, para ser encontrada, mais do que amor.

Por isso, na luta contra o crime, é fácil conquistar a vitória, sempre que os homens escutem a última palavra do Mestre: amais como eu vos tenho amado!”