- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

O estranho mundo do crime

Segunda-feira passada o Espírito Santo teve a grata satisfação de ler uma corajosa reportagem, assinada pela jornalista Michelli Possmozer, que finalmente fugiu à rotina de conectar os índices de criminalidade à pobreza. Fiz referência à coragem por conta de ser muito perigoso questionar “verdades” estabelecidas, dado vivermos todos sob a ditadura do “politicamente correto”.

Falar sobre isso, na verdade, demandaria, no mínimo um livro de consideráveis proporções. Mas que tal tentarmos, na esteira da matéria publicada, alcançar que o fenômeno do crime não é assim tão singelo?

Vamos começar por uma pesquisa publicada lá em Portugal, segundo a qual “90% dos jovens que praticaram crimes tem perturbações mentais”. Nos Estados Unidos, recente estudo constatou que metade da população carcerária apresenta sinais de danos ao cérebro. No Brasil, pesquisa do IMESC divulgada em 2002 identificou 4,5 milhões de psicopatas convivendo conosco cotidianamente – nos Estados Unidos eles são 20% da população. Seria o crime, então, um singelo fruto de doenças mentais? Claramente, não só isso!

E a genética? Há também quem, com base em estudos sérios, veja nela a responsável pela criminalidade. Neste sentido, recordemos dois inquéritos norte-americanos, sobre os Jukes e os Edwards, comparados por Winship Dugdale: “Max Jukes, nascido em 1720, era um pescador, fraco de espírito, cuja descendência é de mais de 2.000 pessoas. Pois bem, destes, 300 morreram recém-nascidos, 600 foram débeis mentais, 60 foram ladrões habituais, 130 criminosos diversos, condenados a penas graves, 7 assassinos, 300 prostitutas, 440 vagabundos, maltrapilhos, precocemente inválidos e mortos, 300, finalmente, ociosos, que nunca procuraram ganhar honestamente a vida: apenas 20, em todos estes, exerceram profissão e a metade deles aprenderam o ofício no cárcere”.

E prossegue ele: “Jonathan Edwards teve também família numerosa. Em 1960 seus descendentes andavam por 1.394. Destes descendentes, 295 formaram-se em universidades, 13 foram diretores de colégios, 65 professores, 60 médicos, 100 padres, 75 oficiais, 60 escritores que produziram 135 obras, algumas de valor, 30 juízes, 3 senadores, 1 Vice-Presidente da República: nenhum membro da família foi jamais condenado pela Justiça”.

Então seria a genética? Não, não creio! Veja-se nela alguma influência, porém não mais do que isso. Mas prossigamos: há também a questão da nutrição. Pesquisadores ingleses, capitaneados por Bernard Gesch, sustentaram que o problema da violência no mundo seria resolvido com uma simples dieta enriquecida de certas vitaminas e minerais – para ser mais preciso, pessoas corretamente nutridas seriam 37% menos propensas a cometer atos criminosos.

Não nos esqueçamos da questão cultural: um estudo feito por dois pesquisadores norte-americanos da Universidade da Califórnia indicou que quem se acostumou a um ambiente corrupto, em que se valorizam o “jeitinho” e o proveito próprio em detrimento do bem-estar geral, tenderá a repetir essa postura.

Vejam que, meio como quem não quer nada, já estamos com diversas causas listadas: pobreza, saúde mental, genética, nutrição e cultura! Nem chegamos ainda na educação, no perfil familiar, na impunidade, na infância etc.

É quando começa a surgir a verdade óbvia de que estamos a tratar de algo absolutamente complexo, e que como tal deveria ser estudado. Como bem alertou a pesquisadora Rossana Mattos, “deve-se tomar conhecimento da complexidade do fenômeno e não simplificá-lo, com propostas paliativas. Ficar discutindo medidas como construção de presídios e redução da maioridade penal, sem buscar as reais causas, não irá resolver o problema da criminalidade”.