- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

O peso da justiça

Infelizmente não se pode deixar de reconhecer que o Poder Judiciário, neste princípio de século e de milênio tem sido, dentre os três Poderes estatais, o mais injustiçado.

Enquanto no mundo civilizado e desenvolvido, os países em geral possuem uma média de um juiz para mil/dois mil habitantes, aqui temos regiões em que há um Juiz para 30, 40 mil habitantes. E em certas áreas a prestação jurisdicional escasseia mais ainda, chegando até a um juiz para cem mil habitantes.

No que se refere à segurança pública, tema proclamado e badalado com ênfase, principalmente nesta época pré-eleitoral, o Judiciário, muito embora vindo cumprindo galhardamente com o seu dever, não deixa de ser o Poder mais causticamente criticado.

Basta dizer que, encerrada a longa e demorada tramitação do processo, em que, em sucessivas e cansativas audiências, são ouvidas testemunhas e mais testemunhas, realização de perícias, acareações, juntadas de documentos e pesquisas na doutrina e na jurisprudência, o Juiz, após prolatar sua sentença, e ver sua confirmação pelos Tribunais Superiores, constata que simplesmente o réu fugiu da cadeia e encontra-se em lugar incerto e não sabido.

Triste é constatar-se que muitos dos condenados, perigosos traficantes, assaltantes, criminosos bárbaros, estupradores, latrocidas, autores de dezenas e às vezes centenas de crimes, ao tomarem conhecimento de sua condenação final, simplesmente fogem da cadeia, para cometerem novos crimes, ou para nunca mais serem encontrados.

Em resumo: após ver tantos pareceres e assistir a tantos debates, em que são citados os maiores luminares do Direito Penal, do Direito Processual Penal, do Direito Constitucional, e de outros ramos do Direito, como Nelson Hungria, Damásio Evangelista de Jesus, Bento de Faria, Manzini, Mittermaier, Malatesta, José Frederico Marques, Carlos Maximiliano, Hely Lopes Meireles e até mesmo o Frei Pantaleão de Aveiro, o condenado não consegue esconder o riso, e, sob gargalhadas homéricas, foge da cadeia, ou seja, absolve-se a si mesmo – e seu exemplo desmoraliza as instituições públicas e o próprio Estado, estimulando e incentivando a criminalidade, que já atinge níveis insuportáveis.

De acordo com as estatísticas oficiais, temos no nosso País cerca de 450 mil mandados judiciais de prisão, que não são cumpridos, sendo que cerca de 50 mil se referem a foragidos das prisões.

Ainda recentemente o Dr. Alexandre Martins de Castro Filho, Juiz de uma das Varas Criminais de Vitória, Capital do Estado, registrava na imprensa que só em sua Vara havia 1.146 mandados de prisão não cumpridos.

Enquanto isso fala-se e proclama-se, alto e bom tom, a necessidade imperiosa, inadiável, imprescritível, irremovível, improcrastinável, de serem feitas reformas penais, com a criação de novos Códigos, novas Leis, novos tipos penais, punições mais rigorosas, introdução da pena de morte, e tantas outras inovações que só são capazes de impressionar leigos e jejunos na matéria.

Diante de um quadro tão triste e lastimável, o surgimento de uma nova geração de Magistrados, que fazem essas denúncias e procuram divulgar as coisas do Judiciário, seu trabalho, seus êxitos, suas perplexidades e seus problemas, merece a melhor acolhida. Já está bem na hora de se conscientizar o povo e os detentores do Poder, mostrando-lhes como a Justiça é injustiçada.

Bem a propósito, vale relembrar Henry Thomas, em seu famoso livro “Vida de Grandes Capitães da Fé”, quando comenta:

“Como Moisés era tratado pelo povo que tirara da escravidão? Criticavam-lhe todos os pensamentos e ações. Se se levantava cedo, diziam: “Levanta-se com o sol a fim de obter para si o melhor maná”. Se se levantava tarde, motejavam: “Está doente por ter comido muito maná”. Se, humilde, se mantinha apartado, queixavam-se de que era soberbo demais para procurar a sociedade dos seus compatriotas. Mas se, levado pelo desejo da convivência, ia para o meio do povo, troçavam: “Vejam como vem pedir de joelhos o nosso aplauso”.