- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

O sabão e a educação

Há alguns dias, visitando a Escola Monsenhor Miguel, na cidade de Guaçuí, tive uma agradável surpresa, daquelas que recomendam uma reflexão cuidadosa sobre a formação ministrada à geração que nos sucederá.

Mas vamos aos fatos: encerrada a atividade que fui desenvolver, relacionada ao Tribunal Regional Eleitoral, fui abordado por uma aluna, a qual me perguntou, feliz e sorridente, se eu gostaria de comprar sabão! Algo surpreso, acabei sendo informado pela Diretora da Escola que havia lá uma fábrica, parte de um programa de empreendedorismo.

E eis-me, em um piscar de olhos, dentro de um empreendimento completo, com área de produção, de contabilidade, de planejamento, de vendas e tudo o mais. Aliás, dentro de dois empreendimentos: optou-se pela criação de duas “empresas”, a fim de que uma competisse com a outra – ao fim do cabo, há que se sentir o “peso da concorrência”.

Funciona assim: dois grupos de estudantes executam todo o trabalho empresarial relacionado à fabricação de sabão, evidentemente sob a supervisão da escola. Da aquisição do material ao destino dos eventuais lucros, do processo de fabricação à gestão de recursos humanos, proporciona-se uma fascinante oportunidade de aprendizado sobre a vida real.

Absolutamente encantado, fui apresentado à “linha de produtos”: sabão em barra, em creme e até na forma líquida. E de boa qualidade, com apresentação correta. Satisfeito, acabei reforçando a despensa lá de casa com tão fina linha de produtos.

No caminho de volta, pela estrada afora, comecei a refletir calmamente sobre o que tinha visto. Lembrei-me de um estudo realizado junto a empresas norte-americanas presentes do Brasil. Vejam que 47% delas apontaram a falta de capacitação dos trabalhadores como o principal problema e desafio a ser enfrentado pelo governo brasileiro.

Deve ser verdade: segundo pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria, a falta de qualificação profissional é o principal problema para as empresas. Aqui mesmo, no Espírito Santo, estima-se que em algumas atividades 40% dos empregados são “importados” de outros estados, por falta de pessoal qualificado em número suficiente.

Mas talvez o número mais chocante venha de um trabalho da Fundação Dom Cabral, refletindo uma realidade absurda e chocante: 67% das empresas pesquisadas enfrentavam dificuldades na contratação de funcionários, apesar dos 8 milhões de desempregados no Brasil.

Entrevistado, o Professor Paulo Resende, responsável pelo levantamento, fez um desabafo: “Somos o país das disparidades: há dinheiro para investir, mas a mão de obra especializada está cada vez mais escassa”. E cita, em seguida, o crescente ingresso de profissionais de outros países no mercado de trabalho brasileiro.

É por essas e outras que dedico estas linhas à saudável iniciativa da escola de Guaçuí – ora, certamente é importante que os alunos saiam da escola sabendo conceituar os alcanos, alcenos, alcinos e alcadienos, pois cultura não ocupa espaço. Igualmente importante é que saibam  – de memória, se possível – o nome do navio que conduziu José Bonifácio para o exílio na distante Europa. Sim, saber isto decerto é importante. Porém, não menos importante é que tenham sido preparados para a realidade prática do mercado de trabalho, com visão consciente e cidadã. Afinal, como profetizou Winston Churchill, “todos os grandes impérios do futuro serão impérios da mente”.