- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

O tempo de Deus

Parece que foi ontem – mas já se passaram 400 domingos desde que, honrosamente convidado pelo jornal “A Tribuna”, comecei a escrever neste espaço. Seja hoje, pois, um dia de agradecimento e de reflexão. 

Minha gratidão aos autores do convite para aqui estar, João Carlos Pedrosa e João Luiz Caser, pela confiança que em mim depositaram. Meu muito obrigado a todos os profissionais deste jornal, pelo apoio com que sempre me honraram. Meu reconhecimento, igualmente, a todos os leitores que, direta ou indiretamente, me incentivaram ao longo desta caminhada. Que eu procure, sempre, ser digno de cada um de vocês. 

Volto, agora, o olhar ao já distante 25 de novembro de 2007, para aquele primeiro texto publicado. Nele, busquei lançar um alerta sobre a desnacionalização de nossa economia. Registrei que até as estatuetas do Padre Cícero, vendidas no Ceará, já eram de procedência chinesa – e isto não poderia ser bom para o Brasil. Tal temor, longe de me ser exclusivo, era o de toda a classe empresarial brasileira. Pois é: e de lá para cá este quadro só fez piorar. 

Foi citado, também, naquele artigo, um estudo da União Européia, comprovando os benefícios da livre circulação de mercadorias e da redução dos entraves burocráticos – conseguiram, entre países, o que o Brasil até hoje não alcançou entre estados ou mesmo municípios. Parece incrível, mas ao longo destes quase oito anos igualmente nada avançamos! 

Mencionei, finalmente, a escabrosa questão dos “incentivos fiscais”, os quais, cotidianamente manejados de forma incorreta, tanto mal fazem aos pequenos empresários nacionais – que não raras vezes protestaram, quase sempre em vão. 

Fiquei a pensar, relendo aquele texto, em quanta coisa defendemos, cada qual em sua trincheira, ao longo dos últimos anos! Fomos às ruas, clamando pelo fim da corrupção. Pedindo eleições justas. Combatendo o coronelismo. Denunciando a tortura. Lutando por justiça. Praticamente implorando por uma melhor infraestrutura. Gritando por socorro diante de índices intoleráveis de criminalidade. Empunhando tão nobres bandeiras, enfim, cada bom brasileiro fez a sua parte, com idealismo e sacrifício, sujeitando-se a violências e represálias – para tudo dar em nada! Aliás, até piorou – olhe pela janela e contemple o provincianismo mais medíocre e corrupto reafirmando-se e sufocando nossa ânsia por um país mais moderno e cosmopolita. 

Enquanto isso, envelhecemos. Passa a apertar-nos o coração a sensação de que não veremos a sociedade menos injusta ou o Brasil grande dos nossos sonhos. O desânimo bate à porta, mascarado de cansaço. É quando começamos a nos calar, contagiando as gerações mais novas, já desiludidas e carentes de esperança diante do gargalhar dos maus. 

Atordoados diante do nosso aparente fracasso em melhorar este mundo, acabamos nos esquecendo de que o nosso tempo não é o de Deus, como bem o demonstrou Gandhi, do alto de sua sofrida luta para libertar o povo indiano: “quando me desespero, lembro-me de que em toda a História a verdade e o amor sempre venceram. Houve tiranos e assassinos, e, por um tempo, pareciam invencíveis, mas, no final, sempre caíram. Os fortes só o são por um instante, como o sonho de uma tarde que dura apenas um momento. No final, são sempre destroçados. São como poeira ao vento. Pense nisso. Sempre”. 

Está aí, no fato de que somos apenas uma efêmera presença em um milenar processo histórico, o chamado a que não deixemos de fazer a nossa parte, com aquela firmeza serena da profética frase brandida por Paulo Coelho em defesa do povo iraquiano, quando seu país era invadido: “que sua manhã seja linda, que o sol brilhe nas armaduras de seus soldados, porque durante a tarde eu o derrotarei”.