- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

Poluição, progresso e responsabilidade

Há alguns dias li em A Tribuna uma impressionante reportagem acerca da nuvem assassina que paira nos céus da Ásia. Feita de poluentes e com 3 km de espessura, ela cobre praticamente todo o sudeste daquele imenso continente. Segundo um estudo da Organização das Nações Unidas, esta nuvem de poluição mata 340 mil pessoas a cada ano somente na Índia e na China, devido a doenças respiratórias, cardiovasculares e até câncer.

O problema da poluição é mundial. A Agência Ambiental Européia divulgou, no ano passado, que a poluição do ar cortou a média da expectativa de vida dos europeus em quase um ano, e contribui para a morte prematura de milhares de pessoas anualmente – apenas na França, apurou-se em 2004, são 4.876 mortos. Calculou-se em 900 mil Euros o custo de cada morte relacionada à poluição do ar.

Globalmente, atribui-se à poluição atmosférica um total de 800 mil mortes prematuras a cada ano, representando 1,2% do total de óbitos. A poluição responde por 5% dos casos de câncer pulmonar, 3% das doenças cardiovasculares e 1% das infecções respiratórias agudas.

Foi com base em dados desta natureza que o Tribunal Distrital de Tóquio condenou a Administração Pública a pagar US$ 643 mil a 99 pessoas que contraíram doenças por conta da poluição do ar. Teria sido este um caso isolado? Não. A Suprema Corte do Japão está encerrando um processo contra os principais poluidores do ar de Tóquio, que terão que pagar cerca de US$ 12 milhões a diversas pessoas vitimadas pela poluição.

Até a genética é afetada. Um estudo canadense publicado pela séria revista Science em 2004 demonstrou que ratos expostos a altos níveis de poluição do ar – próximos a duas siderúrgicas e ao lado de uma rodovia – tiveram níveis de alterações genéticas significativamente mais altos quando comparados a outros mantidos em um ambiente mais limpo.

Diante de tudo isto, fico a pensar no Brasil. Nós temos uma das legislações ambientais mais rígidas do planeta. No entanto, pense duas vezes antes de encher os seus pulmões confiando em todo este emaranhado de leis.

Estaria eu exagerando? Penso que não. Vamos começar pelo ano de 2001, quando a  revista Science publicou um devastador estudo sobre os índices de poluição, internações e mortes em Nova York, Cidade do México, Santiago e São Paulo. Numa projeção para 2020, concluiu-se que se essas cidades baixassem em apenas 10% suas emissões de gases poluentes haveria 800 mil crises de asma a menos (só em São Paulo), e seria possível evitar 64 mil mortes e 65 mil casos de bronquite crônica. Seriam evitadas ainda 60 mil internações por causas respiratórias, 300 mil consultas médicas infantis e mais de 700 mil atendimentos de emergência por causas respiratórias.

Em termos financeiros em 2020, os valores economizados seriam de US$ 21 bilhões em custos médicos e US$ 165 bilhões em custos totais decorrentes das mortes prematuras e perda de produtividade por doenças. Poucos anos depois deste estudo, em 2006, apurou-se que apenas em São Paulo morrem 9 pessoas por dia vítimas da poluição. Eis aí uma realidade dramática – e que talvez não esteja tão longe da gente. Não acredita? Vamos lá: segundo o IBGE, São Paulo tem 8 μg de enxofre por m³ de ar (dados de 2005). Vitória tem 10 μg/m³.

Especificamente quanto ao enxofre cito o exemplo de Hong Kong, que em 1990 aprovou uma lei rigorosa contra emissões deste poluente. Doze anos depois, constatou-se que esta lei salvara 600 pessoas a cada ano e aumentara em 40 dias a expectativa de vida dos habitantes. As doenças respiratórias caíram 5% a cada ano, e as do coração 2%. Foi um gesto de respeito à vida.

Não se ignora que o progresso é algo maravilhoso – mas este deve vir de empresas instaladas em locais corretos, e sob parâmetros ambientais absolutamente claros. Afinal, como proclamou James Whistler, “na natureza não existem prêmios, nem sequer punições – existem conseqüências”.