- Pedro Valls Feu Rosa - http://pedrovallsfeurosa.com.br -

Que democracia?

Dizem os historiadores que Roma não caiu “da noite para o dia”. Antes, foi vítima de um longo processo de corrosão de suas fundações. Foram atitudes pequenas, erros de menor monta e pecados nem tão graves assim que, ao longo dos anos, destruíram conceitos sagrados como a moralidade, o amor pela coisa pública, a cidadania e outros de idêntico jaez, sem os quais não há Estado que sobreviva.

No mais das vezes, uma civilização que vive um processo desses sequer se dá conta de sua existência. Afinal, poucos se dão ao trabalho de analisar o conjunto de uma realidade, diante da rotina de pequenos eventos isolados do cotidiano.

É quando fico a me perguntar se não estaríamos trilhando, sem que o percebamos, um caminho de lenta, porém permanente, corrosão dos pilares que sustentam nossas instituições.

Os sinais estão visíveis, aqui e ali. Isoladamente, pouco dizem. Mas que tal uni-los todos?

Começo por uma pesquisa de âmbito nacional, realizada há alguns meses, que constatou serem apenas 64% dos brasileiros favoráveis à democracia. Do restante, 18% disseram preferir claramente um regime ditatorial, e a outra metade declarou não se importar, desde que haja ordem e a economia vá bem.

Vejam que o Brasil praticamente acabou de sair dos denominados “anos de chumbo”, e no entanto assim pensa quase metade dos seus filhos!

Algum iludido poderia dizer que esta pesquisa foi imprecisa. Não creio. Um outro relatório, da ONU, advertiu recentemente sobre a fragilidade das conquistas democráticas no nosso subcontinente.

Aliás, a própria ONU, em pesquisa não menos recente levada a efeito junto a 18 países da América Latina, colocou o Brasil na 15ª posição no quesito “amor da população pela democracia”. 15ª posição dentre 18 países!

Números muito chocantes, e compatíveis com aquela primeira pesquisa referida, foram levantados. Imaginem que 54,7% dos cidadãos aceitariam um governo autoritário se ele pudesse resolver seus problemas econômicos. 56,3% acham o desenvolvimento mais importante que a democracia. Querem mais? 58,1% acham que o presidente pode ignorar as leis.

Arrisco dizer, à vista de todos estes elementos, que estamos em meio a um considerável processo de enfraquecimento de nossas instituições – a quem duvidar disso, sugiro prestar atenção àquela senhora chamada “opinião pública”, que por três vezes afirmou não se importar com a democracia, e em grau alarmante.