A humanidade dos elefantes

Dia desses, meio que ao acaso, fiquei a meditar sobre os elefantes. Animais fabulosos, os elefantes.

Acreditem: uma das primeiras cenas, talvez a primeira delas, que um elefantinho vê ao chegar neste mundo é a de membros da manada garantindo a segurança do parto! Notável, isso.

Quando a manada é atacada por leões ou outras feras, imediatamente os elefantinhos são posicionados atrás dos adultos, de forma a garantir uma melhor segurança.

Vejam que até no ocaso da vida os elefantes são notáveis: quando um deles está velho, ferido ou doente, não depara-se jamais com o abandono. Muito pelo contrário: a manada fica ao redor, solidária e firme.

O curioso é que os elefantes agem assim naturalmente! Este é um padrão de comportamento – vale dizer, faz parte da natureza deles. Não houve a necessidade de nenhuma “Declaração Universal dos Direitos dos Elefantes” elaborada pela “Organização dos Elefantes Unidos” para que eles se comportassem de forma honrada e digna.

Nunca soube que a manada se reunisse para conferir a um de seus membros uma distinção qualquer por ter este protegido um elefantinho, ou prestado auxílio a um elefante idoso. Repito: eles veem nisso algo normal, o mínimo que se espera de um representante de espécie tão nobre.

Enquanto isso, a cada cinco segundos alguma criança – humana, claro – morre de fome por este planeta afora. Uma criança a cada cinco segundos são 518.400 por mês. Isto dá uns dois mil aviões de passageiros lotados de crianças caindo todos os meses, sob as nossas vistas impassíveis. E preferimos nem comentar isso! Conforta-nos o espírito pensar que “isso é coisa daqueles países miseráveis lá da África ou do sul da Ásia”.

Grande engano! Em média uma a cada cinco crianças dos países ricos – nosso Brasil incluído, juntamente com Estados Unidos, Inglaterra, Itália e outros – vive na mais negra miséria. Uma a cada cinco! Tradução: esta absoluta insensibilidade para com os direitos daquelas pobres crianças acontece aqui mesmo. Sob as nossas vistas. Ali na esquina. E nada fazemos – afinal, não somos elefantes.

Há também as mortes por falta de saneamento básico. São 900 crianças morrendo por hora no mundo só sob esta rubrica. Isto não está acontecendo somente em lugares como Uganda ou Sudão. Absolutamente. Aqui no Brasil, pelas mesmas ruas que percorremos diariamente, 20 crianças perecem a cada dia – vítimas inocentes da falta de uma simples rede de água e esgoto!

Mas nem só de crianças é composta a raça humana. Há também os idosos e os doentes

Quanto aos idosos, 30% deles passam fome na tão humana Europa, abandonados por uma sociedade das mais ricas do mundo. E os doentes? Sobre estes, basta uma rápida visita à maioria dos hospitais públicos de qualquer continente que se escolha – os resultados não serão assim tão diferentes.

Inclusive, não faz muito tempo li uma chocante reportagem sobre pacientes espalhados em ambulâncias, corredores, recepções, elevadores e até banheiros de hospitais ingleses. Sim, isto acontece até na riquíssima Inglaterra.

Tradução: não falemos em falta de recursos. A uma, pelo cinismo que isto traduziria diante de tanta riqueza desperdiçada ou desviada sob as nossas vistas. E a duas porque este é um padrão de comportamento humano. A humanidade é quase toda assim.

Talvez, diante do Natal que se avizinha, fosse o momento de sonharmos com o dia em que, como na canção de Roberto Carlos, finalmente os homens serão civilizados como os elefantes.

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