A pena de morte no Brasil

Há poucos dias li nos jornais que a União Européia lamentou, de forma oficial, a milésima execução de uma pena de morte nos Estados Unidos desde o retorno deste tipo de punição, em 1976.

Peguei uma calculadora e fiz algumas contas. Foram mil execuções em uns 33 anos. Isto dá umas 30 por ano. Concluí que a média mensal de execuções ficou em 2,5 – arredondemos para 3. Podemos assumir, assim, que a cada mês são executados três seres humanos nos Estados Unidos.

O Brasil não tem pena de morte. Aliás, em todas as vezes que alguém apresentou propostas neste sentido vimos a Sociedade se levantar protestando – afinal, este é um país humano, cordial e tolerante. Temos orgulho disso!

No entanto, segundo um detalhado estudo conduzido pelo sociólogo José de Souza Martins, da Universidade de São Paulo, ocorrem aqui no Brasil – este mesmo Brasil que tantas vezes repudiou a pena de morte – inacreditáveis quatro linchamentos por semana. O mais chocante é que, dentre 20 mil casos pesquisados, localizou-se uma única condenação!

Voltei à calculadora e concluí que nos mesmos 33 anos nos quais os Estados Unidos executaram mil condenados nós matamos, no meio de nossas ruas, 6.336 suspeitos! Uma advertência: não estão computadas as mortes em tiroteios ou confrontos – estes números só incluem os linchamentos!

Há ainda um outro aspecto a ser realçado: aqui não se executa ninguém por injeção letal ou coisa que o valha – em nosso país recorremos aos chutes, pontapés, pauladas, pedradas e o que mais estiver à disposição. Até um cavalo foi utilizado, há poucos meses, para pisotear dois suspeitos que estavam sendo linchados sob as vistas de umas mil pessoas.

Destes números podemos extrair uma primeira conclusão: já passou da hora de o Brasil, discutindo de forma séria o combate ao crime, retomar o caminho da civilidade. E, nesta caminhada, talvez fosse bom olharmos para um curioso aspecto que envolve os linchamentos: o acerto dos vereditos!

Não, não me refiro ao acerto da conduta dessas pessoas, e fique isto muito claro – repudio os linchamentos e declaro-me contrário à pena de morte. Refiro-me apenas à conclusão de culpa ou inocência. Segundo constatou-se, em 20 mil casos pesquisados a sabedoria popular errou em menos de 3% dos casos. Eis aí algo digno de nota.

Enquanto isso, nos Estados Unidos, um estudo sobre 4.578 processos durante 22 anos concluiu que 68% das condenações à morte continham erros e foram anuladas. Apurou-se que a margem de erro nos três estados norte-americanos com o maior índice de execuções é absurda: 18% na Virginia, 52% no Texas e 73% na Flórida. Recordo que no Brasil o veredito popular mostrou-se incorreto em menos de 3% dos casos. Há algo de bom a se extrair disso.

A grande verdade, diante destes exemplos, é que já passou da hora de mudarmos a filosofia de atuação do nosso sistema judicial. Precisamos de leis mais simples e de uma maior participação da Sociedade nos julgamentos. Seria sonhar demais pensar em um sistema criminal no qual a própria população julgasse, de forma rápida e simples, suspeitos que hoje aguardam meses ou anos por um veredito?

A quem disser que isto não pode ser, respondo que já é, e da pior e mais desumana forma possível. Que o digam os quatro suspeitos condenados à pena de morte e executados a pauladas e pontapés pelas ruas do civilizado Brasil todas as semanas.

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