Nossos letrados

Dia desses assisti a um interessante documentário sobre os horrores patrocinados pelo regime nazista contra os judeus. Indo além do simples exibir de cenas macabras, os historiadores que assinaram a produção lançaram uma pergunta intrigante: qual o perfil dos monstros que comandaram o extermínio de seis milhões de vidas? Quem eram esses homens?

A resposta chocou-me. Dos 21 primeiros comandantes dos grupos de extermínio, 10 tinham doutorado! Mencionou-se inclusive um que fazia questão de ser chamado “Dr. Dr. Rasch”, a fim de que todos o soubessem portador de dois!

Pasmo, tomei conhecimento de que a maioria dos quadros da tão cruel Gestapo era de juristas. Os demais eram linguistas, historiadores, economistas, filósofos, homens de letras etc. – todos provenientes da mesma classe social!

Pus-me a refletir sobre o mundo de hoje. Quem, no comando de algumas de nossas grandes corporações, estimula guerras e massacres pelo mundo afora para auferir vantagens cada vez maiores? Nossos letrados!

Quem, na regência da máquina pública, mata milhões de seres humanos ao desviar recursos destinados à saúde etc.? Também aqui, nossos letrados.

Quem, à frente de poderosas instituições financeiras, manipula mercados e moedas, satisfazendo uma ganância insaciável ao custo da dor, do sofrimento e até da vida de tantos semelhantes? Uma vez mais, nossos letrados.

Quem, definindo as bases do sistema legal da humanidade, garante a impunidade dos maus? Nossos letrados, é claro!

Quem, controlando o fluxo de informações, deixa às cegas larga parcela da humanidade, ao custo de entregá-la mansamente à sanha dos maus? Evidentemente, nossos letrados!

Quem, pelo mundo afora, prostitui a democracia, transformando-a muitas vezes em instrumento de embuste e opressão? Acredite: nossos letrados.

Quem abusa dos consumidores, envenenando-os e matando-os com produtos sabidamente nocivos por pura ganância? Sim, eles: os nossos letrados!

Reflita: mencionamos os maiores flagelos da humanidade – e em nenhum deles está presente aquela camada social à qual tantos, preconceituosamente, se referem como “o Zé-Povinho”.

Foi quando fiquei a pensar em Rousseau, ao exclamar: “Deus Todo Poderoso, livrai-nos das ciências e das artes e restitui-nos a inocência e a pobreza, únicos bens que podem trazer felicidade”!

Enviar por e-mail Imprimir