O alerta de Nuh

Dia desses, lendo o Jakarta Post, deparei-me com uma singular declaração do Ministro da Educação e Cultura da Indonésia, Mohammad Nuh: “Dirijo-me às pessoas instruídas: não se envolvam em corrupção. Vocês conseguiram um elevado nível educacional e ainda querem ser corruptas? A corrupção é inadequada, especialmente para pessoas instruídas”.

Talvez seja este o alerta que falta ao Brasil, país no qual as elites se divertem contando a conhecida piada segundo a qual, quando da Criação, o Brasil teria sido privilegiado com riquezas imensas e poupado dos desastres naturais que atingem outros países para compensar o “Zé Povinho” que seria colocado aqui.

É realmente curioso: a falência moral do nosso país, invariavelmente administrado por pessoas do mais elevado quilate intelectual, é culpa do “Zé Povinho”! Fiquei a pensar na sabedoria secular do Padre Antônio Vieira, de cujos ensinamentos aparentemente se esqueceram nossos luminares.

Lá pelos idos de 1655, ao proferir o antológico “Sermão do Bom Ladrão”, realizado na Igreja da Misericórdia de Lisboa, Conceição Velha, perante o Rei D. João IV e toda a sua corte, teve o Padre Vieira a coragem de disparar palavras firmes:

“Levarem os Reis consigo ao Paraíso ladrões, não só não é companhia indecente, mas ação tão gloriosa e verdadeiramente real, que com ela coroou e provou o mesmo Cristo a verdade do seu reinado, tanto que admitiu na cruz o título de rei. Mas o que vemos praticar em todos os reinos do mundo é, em vez de os reis levarem consigo os ladrões ao Paraíso, os ladrões são os que levam consigo os reis ao inferno”.

“O ladrão que furta para comer não vai nem leva ao inferno: os que não só vão, mas levam, de que eu trato, são outros ladrões de maior calibre e de mais alta esfera. Os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos. Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos”.

Decorridos já mais de 300 anos, continuam rigorosamente atuais as palavras daquele grande sacerdote. E com ele concluo: o culpado pela nossa falência moral não é o nosso pobre “Zé Povinho” – este, pelo contrário, é vítima.

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