O nosso maior desafio

Dia desses, depois de ler o noticiário sobre mais uma passeata realizada pelas ruas do Brasil, tive a ideia de fazer uma pequena pesquisa sobre a situação do regime democrático pelo planeta afora – e o resultado me tirou o sono.

Comecemos pelo Reino Unido: em 1950, 20% dos ingleses eram filiados a algum partido político – hoje, são apenas 1%. Não surpreende, assim, ter uma sondagem de opinião pública revelado que 62% dos eleitores pensam que “políticos mentem durante todo o tempo”.

Um outro estudo, levado a efeito sobre 49 países nos quais o voto não é obrigatório, constatou que entre 1980 e 2013 o comparecimento dos eleitores caiu quase 20%. Este resultado relaciona-se com um outro, fruto de pesquisa realizada nos idos de 2012 em sete países europeus, segundo o qual metade dos eleitores não tem nenhuma confiança em seus governos.

Nos Estados Unidos da América, em 1964, 3/4 da população declaravam confiança no governo – contra apenas 1/4 em 1996, e magros 12% em 2014. Naquele país, entre 1958 e 1994, a parcela dos que acreditam serem os governantes corruptos pulou de 24% para 52%.

Na Rússia, apenas 1% dos habitantes estão interessados em política, 26% disseram não querer nem ouvir falar sobre o tema, 41% demonstraram baixíssimo interesse nele e exíguos 28% declararam acompanhá-lo.

Na América Latina, recente pesquisa levada a efeito pelo PNUD retratou que 54,7% dos cidadãos aceitariam um governo autoritário se ele pudesse resolver os problemas econômicos do país. O mesmo estudo demonstrou que para 56,3% da população o desenvolvimento é mais importante que a democracia.

Uma outra sondagem de opinião pública, realizada em 2006, constatou que 13,5% dos brasileiros preferem uma ditadura. Outros 16,9% se disseram indiferentes. E apenas 64,8% dos nossos compatriotas disseram preferir o regime democrático. Haveria algum erro nesta pesquisa? Penso que não: uma outra, mais recente, realizada pela ONU junto a 18 países da América Latina, colocou o Brasil em 15º lugar quanto ao nível de adesão da população à democracia. Recordaria, ainda, pesquisa publicada pela revista “The Economist”, segundo a qual apenas 37% dos brasileiros confiam na democracia.

Pois bem: constatado o declínio de tão importante instituição cumpre partamos, e sem vacilações, rumo à identificação de suas causas, com vistas a eventuais correções de rumo. A propósito, talvez um início de resposta esteja na manchete do jornal “Nigerian Tribune” do dia 29 de maio de 2010: “11 anos de democracia: até aqui, o que?”

Está aí, nesta pergunta, aquele que talvez seja o maior desafio da humanidade: provar ser possível o desenvolvimento pleno sob um regime democrático.

Para tal há que se garantir aos governos agilidade e força indispensáveis à materialização de medidas gerenciais – mas de uma forma tal que abusos e atos de corrupção sejam claramente prevenidos, destacados e punidos. Há que se garantir a punição rigorosa e rápida de todos aqueles que violarem as leis – porém, observados todos aqueles princípios relacionados à ampla defesa. Há que se conceber um sistema eleitoral verdadeiramente aberto, justo  e representativo – e que proporcione aquela estabilidade tão indispensável ao desenvolvimento.

Alguém diria que alcançar este ponto de equilíbrio é tarefa destinada aos séculos. Pode ser. Mas não será porque não podemos fazer tudo que nada faremos – e eis aí nossa mais sagrada responsabilidade histórica e espiritual.

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