O veneno nosso de cada dia

Poucos brasileiros se deram conta disso, mas em 2008 o Brasil conseguiu um significativo título mundial: passou a ser o maior consumidor de agrotóxicos do planeta – um mercado que movimenta uns bons US$ 7 bilhões a cada ano.

Há algum tempo tive a oportunidade de ler uma interessante relação de substâncias então utilizadas aqui no Brasil para este fim. Começo pelo acefato, cujo uso foi proibido pela União Européia sob os fundamentos de neurotoxicidade, suspeita de carcinogenicidade e de toxicidade reprodutiva.

Havia também o carbofurano, proibido na União Européia e nos Estados Unidos da América. Os motivos: alta toxicidade aguda e suspeita de desregulação endócrina. O ítem seguinte era a cihexatina, proibida na União Européia, no Japão, nos Estados Unidos da América e no Canadá. Segundo consta, sobre ela pesa alta toxicidade aguda, suspeita de carcinogenicidade para seres humanos, toxicidade reprodutiva e neurotoxicidade.

Não menos problemático é o endossulfam, de uso proibido na União Européia e na Índia, por conta de alta toxicidade aguda, suspeita de desregulação endócrina e toxicidade reprodutiva. E o que dizer do forato? Por conta de alta toxicidade aguda e neurotoxicidade já havia sido banido da União Européia e dos Estados Unidos da América, mas seguia firme e forte por estas bandas. Aliás, até mesmo de um projeto de lei para proibi-lo lançou-se mão!

O fosmete, uma outra substância que aqui estava liberada, havia sido proibido na União Européia em função de neurotoxicidade. Aliás, a mesma União Européia já havia banido o lactofem, considerado carcinogênico para humanos – a propósito, nós brasileiros somos humanos, não?

Deparei-me com um outro elemento de nome até engraçado: metamidofós! Bem, o nome pode até ser exótico, mas os efeitos dele não: alta toxicidade aguda e neurotoxicidade. Dados estes efeitos, ele foi banido da União Européia, China e Índia.

E que dizer do tricloform? Banido da União Européia em função de neurotoxicidade, potencial carcinogênico e toxicidade reprodutiva, transitava livremente pelo Brasil. Já um tal de tiram, que aqui circulava, foi proibido lá nos Estados Unidos da América, dado que estudos demonstraram mutagenicidade, toxicidade reprodutiva e suspeita de desregulação endócrina.

Não menos nociva é a parationa metílica, de utilização proibida na União Européia e na China. O rol dela é grande: neurotoxicidade, suspeita de desregulação endócrina, mutagenicidade e carcinogenicidade.

Há poucos meses foi divulgado o Centro Agropecuário de 2009. Foram identificados 25.008 casos de intoxicação por conta da utilização de agrotóxicos em nada menos que 1.396.000 fazendas brasileiras. Um detalhe sinistro: o pulverizador costal, aquele no qual o recipiente de veneno fico preso às costas do agricultor, foi o usado em 84,7% dos locais nos quais foram informados casos de intoxicação – a razão é que qualquer vazamento vai diretamente para o corpo.

Até onde soube, acha-se em marcha um saudável e providencial movimento de revisão das autorizações de comercialização das substâncias acima – algo complicado, por envolver desde processos judiciais até inúmeros testes de laboratório.

Enquanto este longo processo não termina, podemos ir nos entupindo de comida a cada dia sem maiores preocupações – afinal, parodiando Euclides da Cunha, “o brasileiro é um forte”.

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