Uma conta difícil de fechar

O petróleo é uma riqueza não renovável. Ou seja: algum dia ele acabará. Trata-se de um mineral de extração difícil e cara. São milhares de empregados, em terra e no mar, arrancando o “ouro negro” de poços profundos, invariavelmente com elevado risco pessoal. Alguns morrem, outros se acidentam, e quase todos passam a vida profissional a bordo de plataformas em alto-mar, distantes de suas famílias.

Há poucos dias li que exportamos uns bons 620 mil barris de petróleo por dia, ou mais de 19 milhões de barris por mês – dados de dezembro de 2008. Os Estados Unidos foram o principal destino das exportações, recebendo 63% deste total. Um barril de petróleo tem cerca de 159 litros. No dia em que escrevi estas linhas cada barril custava US$ 42, ou R$ 96,60. Isto significa que cada litro de petróleo exportado pelo Brasil custa R$ 0,60.

A água é uma riqueza renovável. Basta uma chuva e os rios voltam a encher. A exploração das nascentes de água é uma atividade simples e segura, que muito dificilmente expõe os empregados a riscos. Nem de longe podemos comparar a estrutura necessária para captar água com aquela relativa à prospecção de petróleo – eis aí o óbvio.

Há poucos dias, percorrendo um supermercado, encontrei uma garrafinha de água mineral importada. Eram 750 ml vendidos por R$ 12,00. Ou seja: cada litro desta água mineral que o Brasil importa custa R$ 16,00. É difícil de entender como é que exportamos um litro de petróleo por R$ 0,60 e compramos um litro de água por R$ 16,00, ou 26 vezes mais.

Mas deixemos para lá a água mineral importada – afinal, água mineral é um luxo. Fiquemos com o litro de leite de nossas próprias vacas. Um litro de leite Longa Vida é vendido em nossos supermercados por empresas estrangeiras a cerca de R$ 1,92. Aí a conta fica mesmo difícil de fechar: exportamos um litro de petróleo por R$ 0,60 e compramos de estrangeiros um litro de leite de nossas próprias vacas por quase três vezes mais!

Alguém diria que comparar água e leite com petróleo é injusto. Realmente é – com a água e o leite, riquezas renováveis e de fácil extração. De qualquer forma, que tal compararmos petróleo com petróleo? Conforme mostramos, nosso país exporta um litro de petróleo a R$ 0,60. Com este petróleo os Estados Unidos fazem gasolina e a vendem aos norte-americanos a R$ 1,20 o litro. Graças ao mesmo petróleo compramos uma gasolina que já não é pura, eis que misturada com álcool combustível, por R$ 2,99 – ou mais do que o dobro!

O minério de ferro é uma riqueza não renovável. Algum dia ele acabará. Eis aí outro produto complicado de extrair e transportar. Milhares de brasileiros passam a vida profissional nas minas, muitas vezes sob condições difíceis ou insalubres. O próprio manuseio do minério de ferro gera poluição  – o popular “pó preto” – que aflige diversas cidades, causando doenças respiratórias dos mais diversos tipos.

Conforme apurei, uma tonelada de minério de ferro fino tem sido vendida por US$ 78,90, ou R$ 181,47. Isto após uma longa guerra comercial – até pouco tempo a tonelada custava apenas US$ 47,81, ou R$ 109,86.

Dia desses li que uma garrafa de vinho Romanée-Conti safra 2004 custa, em São Paulo, até R$ 10.980,00. É mesmo difícil de compreender: exportamos uma tonelada de minério de ferro por R$ 181,47 e compramos uma garrafa de vinho por R$ 10.980,00. Tradução: enviamos mais de 60 toneladas de minério em troca de uma única garrafa de vinho.

Escolhi um vinho caro demais como exemplo? Então fiquemos com o chocolate mesmo. Uma latinha de 250 gramas de chocolate suíço custa, no mercado, uns R$ 70. Isto dá cerca de R$ 280 o quilo. Ou seja: exportamos 1 tonelada de minério por R$ 181,47 e compramos um quilo de chocolate por R$ 280. E olhe que lá na Suíça, até onde eu sei, não existe nenhuma plantação de cacau!

Não sei por qual motivo, mas veio-me à cabeça neste momento aquela frase do presidente do Peru, Alan Garcia: “a única matéria prima da América Latina que mantêm seu valor, ou sobe de preço constantemente, é a coca e seus derivados”.

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