A honestidade e a hipocrisia

Dia desses li uma interessante frase de Bernard Shaw: “a diferença entre um assaltante e um homem de bem é que o assaltante rouba dos ricos”. Fiquei a meditar, então, sobre uma interessante reportagem publicada em um jornal holandês, baseada em uma experiência lá feita.

Transcrevo, a seguir, trechos da reportagem: “Teste das carteiras perdidas mostra que os ricos tem maior tendência a ficar com o dinheiro. Sete das doze carteiras ‘esquecidas’ em Amsterdam, por conta de uma experiência destinada a testar a honestidade das pessoas, foram devolvidas aos seus donos”.

E prossegue a notícia: “Porém, nenhuma das carteiras ‘acidentalmente perdidas’ em um Shopping Center de luxo foi devolvida. “Pessoas ricas e bem-sucedidas cuidam bem de si próprias”, disse o psiquiatra Bram Baker. “O lado escuro disso é que, tendo chance, elas pegam o que podem”, completou”.

Decidi futucar meu banco de dados, buscando algo mais sobre o assunto. E encontrei a notícia a seguir, publicada em “A Tribuna” nos idos de 2007: “Cerimoniais estão colocando câmeras até na porta dos banheiros para reduzir os furtos que ocorrem nos eventos. Quem pensa que as casas de festas são apenas locais de diversão está enganado. Bolsas, celulares e principalmente talheres e enfeites de mesa são roubados durante festas de casamento, aniversários e formaturas, e os acusados são os próprios convidados. Para inibir esses furtos, os cerimoniais estão instalando câmeras que já começam a flagrar os crimes”.

Curiosamente, registrou-se em seguida o depoimento de dois proprietários de uma casa de festas, segundo os quais os maiores problemas são verificados precisamente nas festas mais luxuosas.

É realmente um quadro digno de nota: nos Estados Unidos, 53% dos furtos acontecidos em lojas são fruto da ação de representantes das classes alta e média daquele país – os prejuízos montam a mais de US$ 2 bilhões anuais.

Na África do Sul, um jornal registrou recentemente uma tendência crescente entre adolescentes de famílias ricas: furtar objetos em lojas de centros comerciais luxuosos. Em Portugal, um outro periódico divulgou os resultados de uma pesquisa no sentido de que as fraudes acadêmicas são maiores entre alunos mais ricos.

Estaria aí a resposta para os níveis de corrupção que infernizam a humanidade? Vale a pena pensarmos sobre isso. Alguém aí se lembra, por exemplo, da crise econômica de 2008? Ela custou a dezenas de milhões de pessoas suas economias, seus empregos e até mesmo suas casas. Os culpados foram alguns poucos que, já riquíssimos, não se importaram em massacrar seus semelhantes para ainda mais ricos ficarem.

O Brasil, por exemplo, perde anualmente cerca de R$ 26 bilhões com a corrupção, o equivalente ao orçamento de até sete Ministérios pequenos, quase o da Educação, ou cerca de 1,35% do PIB. Quanto aos culpados, não devem ser buscados dentre as fileiras dos miseráveis, evidentemente – antes, são em sua maioria finos cavalheiros, tratados com respeito e consideração em todo e qualquer evento social que se preze. Um amigo me dizia, aliás, que “quanto mais bandido, mais aplaudido”. Será?

Por conta disso, pelo planeta afora vem caindo os índices de confiança na democracia. Na Europa, 50% dos eleitores não confiam em seus governos. Nos EUA, este índice era de 75% em 1996 e de apenas 12% em 2014. Na América Latina, recente pesquisa levada a efeito pelo PNUD retratou que 54,7% dos cidadãos aceitariam um governo autoritário se ele pudesse resolver os problemas econômicos do país.

Pois é. Talvez seja o momento de recordarmos a sábia advertência de Vincenzo Gioberti: “os maiores inimigos da liberdade não são aqueles que a oprimem, mas sim aqueles que a sujam”.

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