Justo Veríssimo não morreu

Dia desses, relendo alguns jornais de outros países, fiquei – não sei bem por qual motivo – a pensar no personagem Justo Veríssimo, criação da mente genial do saudoso humorista Chico Anysio.

O povo está com fome? O Secretário do Departamento Estadual do Bem-Estar Social do Estado de Bihar, na Índia, tem a solução: incentivar os pobres a comer carne de rato. Segundo declarou à rede BBC, “há duas vantagens nesta proposta. Primeiro, podemos salvar pelo menos metade dos nossos estoques de grãos e, em segundo, podemos melhorar as condições econômicas da comunidade”.

Por incrível que pareça, este elemento tem um seguidor fiel lá no Camboja, que atende pelo nome de Ly Marong, e que assim se pronunciou sobre o comércio de carne de rato, praticado pelos miseráveis daquele país: “Muitas crianças estão felizes ganhando dinheiro vendendo estes animais no mercado, evidentemente sempre reservando algo para suas famílias”.

O povo perde muito tempos nos engarrafamentos de trânsito rumo ao trabalho? O Governador Regional de Moscou, na Rússia, um certo Boris Gromov, imediatamente resolveu o problema: “Eu ando de helicóptero. Vocês deveriam fazer a mesma coisa, comprando helicópteros ao invés de carros – aí não precisariam mais de estradas”. Para quem não consegue voar por aí, digna de menção a saída engendrada pelo Senador italiano Gustavo Selva: fingir-se de doente e chamar uma ambulância.

O governo tem gasto muito com o tratamento médico dos menos favorecidos pela sorte? Com a palavra o Ministro das Finanças do Japão, Taro Aso: “o problema das despesas do Estado não será resolvido a não ser que os idosos possam se apressar e morrer” – tradução: que deem cabo em suas próprias vidas, e pronto! Simples assim. Ainda sobre idosos, no Reino Unido estão chegando à conclusão de que, por medida de economia, eles não devem ter acesso a todos os medicamentos contra câncer.

A patuléia já não suporta mais os escandalosos índices de corrupção? Que ouça a curiosa ponderação do Ministro do Interior da Rússia, um tal Vladimir Rushailo: “não vamos confundir propina com corrupção”.

A voz das ruas incomoda o poder estabelecido? A receita para silenciá-la vem da Turquia: basta proibir as denominadas “redes sociais” – afinal, como declarou o Primeiro-Ministro Tayyip Erdogan, elas “são a pior ameaça à sociedade”.

As taxas de natalidade do país estão caindo? Com a palavra o Ministro Hakuo Yanagisawa, do Japão, aconselhando “as máquinas de fazer filhos a terem o melhor desempenho possível”.

Se a chegada de muitos imigrantes pobres incomoda os eleitores, o francês Jean-Marie Le Pen, presidente de honra de um partido político, tem a solução: uma epidemia de Ebola “pode resolver o problema em três meses”. Caso isto não dê certo, há a alternativa do uso de armas químicas, conforme sugerido há algumas décadas pelo Primeiro-Ministro britânico Winston Churchill: “eu não entendo essa sensibilidade toda pelo uso do gás. Sou fortemente favorável a usá-lo contra tribos não-civilizadas”.

Mas prossigamos: se o problema das elites nacionais for com pessoas de etnia cigana, segue o comentário do Deputado francês Gilles Bourdouleix: “Hitler talvez não tenha matado ciganos suficientes”.

O fato é que a sensibilidade desse pessoal é mesmo um espanto! Que o diga a diplomata norte-americana Maureen Chao, diante de crianças de uma escola indiana, reclamando de um atraso na viagem: “após 72 horas, o trem ainda não havia chegado ao seu destino … e minha pele ficou suja e escura como a de vocês”.

Diante deste quadro, patrocinado pelos poderosos de plantão, fico a recordar a genial ironia de Wanke: “gosto de ir aos cemitérios, admirar os túmulos dos que venceram na vida”.

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