Adivinhe de onde vem

Resolvi que hoje não escreverei texto algum. Achei melhor lançar um desafio: transcreverei trechos de notícias que li em jornais estrangeiros, sem mencionar a qual país se referem. Após lê-los, tente adivinhar de onde vieram. Ao final, fornecerei o “gabarito”. Considere dois pontos para cada acerto. 

A primeira notícia é sobre dada declaração proferida por um Governador. Reagindo à descoberta de que lá na região dele 40% dos mendigos são vítimas de ataques, assim manifestou-se: “qualquer um que ataque estas pessoas desprotegidas estará cometendo atos verdadeiramente repulsivos”. Em seguida, completou: “O fato de muitos desses agressores serem jovens reflete um problema a ser enfrentado em nossas escolas. Assim, é meu desejo perseverar e prosseguir no caminho de educar nossos estudantes sobre compaixão e sobre o drama de se viver sem um abrigo”. 

A segunda notícia: “25% dos habitantes estão ameaçados de pobreza ou exclusão social”. Do mesmo texto extraí o seguinte trecho: “10% dos habitantes estão em situação de privação material severa”. 

A terceira notícia: “47 milhões de habitantes atingidos por cortes no programa governamental de doação de alimentos. Isto significará a redução de 21 refeições por mês para cada um dos beneficiários”. Pronunciando-se, a diretora de uma associação de combate à miséria declarou que o resultado destes cortes será “o aumento da fome, afetando a saúde de idosos e deficientes e forçando mais crianças a irem para as salas de aula sem alimentação”. 

A quarta notícia trata de buracos nas ruas: “A quantidade de crateras nas pistas [do país] está tão grande que se estas fossem reunidas mediriam 765 km2”. Só para fins de comparação, isso dá umas oito vezes o tamanho da cidade de Vitória! 

A quinta notícia refere-se ao mundo das leis: “Justiça asfixiada. Sobrecarga de trabalho, acumulação de processos, dificuldade de aplicar as penas. Os problemas ilustram até a caricatura as disfunções da máquina judiciária. Os ratos percorrem as salas insalubres dos cartórios. Os elevadores foram desligados [há cinco meses] depois que um operário foi eletrocutado”. 

Leu tudo? Então vamos ao “gabarito”. A primeira notícia, relativa ao massacre de mendigos, veio de Tóquio, no Japão, pelas páginas do “Japan Today”. A segunda, anunciando preocupantes índices de pobreza e miséria, refere-se à União Europeia, e foi publicada pelo respeitado jornal “Le Monde”. A terceira, sobre escandalosos índices de fome, retrata a realidade dos Estados Unidos da América, tendo sido publicada pelo sério “USA Today”. A quarta, sobre os milhares de buracos em pistas, fala do Reino Unido, e a li no jornal “Metro”. A quinta, publicada no “Le Monde”, é uma descrição do Tribunal de Bobigny, o segundo maior da França. 

Qual foi a sua nota? Repare que não falei de temas locais, apenas nacionais – imagem de uma realidade, pois. 

Pois é: talvez nossos conhecimentos sobre a realidade do planeta estejam desatualizados, e a importância do nosso país neste novo cenário que se descortina seja maior do que pensamos. E talvez não estejamos, enquanto toda uma geração de brasileiros, agindo conforme as exigências do momento histórico. 

Não escrevo estas linhas para que alguns busquem refúgio no argumento medíocre e falso de que “eles estão iguais a nós”. Absolutamente. Apenas não consigo entender os motivos pelos quais, historicamente, de forma humilde e de cabeça baixa, temos entregado a estrangeiros o melhor de nossas riquezas e a mais rica fatia de nossa economia, em um processo de internacionalização talvez único no planeta – e tudo isto praticamente sem reciprocidade. 

Será este, ouso perguntar, o lugar de direito do Brasil na constelação nas nações? 

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