Conta estranha

Dia desses, conversando com um amigo sobre o problema da criminalidade, ouvi que a solução passa pelas prisões – “há que se prender mais”. Após muito refletir cheguei a uma conclusão oposta: na verdade há que se prender menos, porém apenas quem deveria ser preso. Qualquer outra medida não será efetiva, tendo apenas a aparência de solução.

Explico: o Espírito Santo, por exemplo, tem 13.829 vagas em suas prisões – que abrigam, porém, 24.173 pessoas. Tradução: estamos com 74,79% de sobrecarga. Alguém aí acredita que temos condições de duplicar esta estrutura, acomodando de forma legal tantos presos?

Agora acrescentemos mais um número a este cálculo: 11.714. Trata-se do número de mandados de prisão que não foram cumpridos – estão por aí, vagando sem destino, jogando em nossas faces a realidade de que neste país a impunidade é uma instituição.

Imaginemos que estes foragidos sejam capturados. Aí alcançaremos a marca de 35.887 presos – a serem acomodados em 13.829 vagas. Isto significa que seria necessário praticamente o triplicar da estrutura atual somente para enfrentarmos a situação como ela se apresenta. Alguém aí acredita que isto será feito?

Agora, em um exercício de imaginação, suponha que nosso sistema legal decida “prender mais”. Como? Não há a menor possibilidade prática de que isso aconteça – simplesmente não teríamos onde colocar tantos presos. Aliás, já não temos onde colocá-los, eis a verdade! O desumano quadro atual apenas se sustenta, ao fim do cabo, por conta de crueldade e omissão extremas.

Sirva-nos de consolo o fato de que este problema é universal – do Reino Unido aos EUA, da França a Uganda, praticamente toda a humanidade está a enfrentar este dilema. Lentamente, começa a surgir clara a verdade de que a quantidade de prisões exigida pelas leis é impossível de ser construída.

Daí surge lógica a verdade de ser necessário, perdoando a expressão, ‘prender menos, mas melhor’ – simples assim. Esta, em resumo, a pergunta a ser feita: quem deve ter sua liberdade efetivamente cerceada e como?

Pelo planeta afora alguns bons exemplos neste sentido começam a raiar. Que tal começarmos, assim, a discutir esta séria questão de forma mais técnica e realista? Que tal retirarmos do debate o viés ideológico, que tantos muros levanta e tantas pontes destrói?

Enviar por e-mail Imprimir