O mundo que eu conheci não é mais o mesmo

Dia desses li uma interessante frase do pensador francês Edgar Nahoum. Disse ele: “uma convicção bem afirmada destrói a informação que a desmente”. É o caso da esmagadora maioria dos brasileiros, sempre reafirmando conceitos de país e mundo que a realidade há muito já destruiu.

Começo pela fome. Cada um de nós cresceu ouvindo que o Brasil é um país de famintos, cujos filhos morreriam de fome se o Governo não lhes desse comida. Aprendemos, também, que os Estados Unidos da América são a terra da fartura. Eu achava isso – até ler uma pesquisa do governo de lá, indicando que 15% dos norte-americanos, ou um a cada sete, estiveram na linha da fome em 2008. Fiquei ainda mais pasmo ao ler, na MSNBC, que 37 milhões de pessoas, incluindo 14 milhões de crianças, receberam ajuda governamental ou de instituições de caridade em 2008 para que não morressem de fome! Repito: não estou falando do Uganda ou do Brasil, mas dos Estados Unidos da América, o país mais rico e um dos principais exportadores de soja e carne do planeta!

Nós crescemos ouvindo a arenga de que o Brasil é a terra da impunidade e da esculhambação, na qual “tudo dá em nada”. Enquanto isso, sempre trombetearam nas nossas orelhas que na Inglaterra, por exemplo, leis são coisa séria. Cada um de nós seguramente já teve algum amigo ou professor que repetisse isso. Pois é. Há não muito tempo, porém, li um estudo do governo daquele país comprovando que 97% dos crimes lá cometidos não são sequer objeto de processo, e que 41% das multas jamais são pagas!

E as infelizes crianças pobres? Desde a mais tenra infância eu as associo às ruas miseráveis da América Latina e da África – afinal, foi isto que martelaram em minha cabeça dia após dia, ano após ano. Já quanto ao Canadá, sempre o consideramos um modelo de distribuição justa de riquezas e de bons padrões de vida. Pode ser. Mas lá está uma outra pesquisa, igualmente governamental, comprovando que 637 mil crianças canadenses vivem na pobreza, privadas de alimentação, saúde e educação. Fiquei absolutamente pasmo ao ver, na reportagem que divulgou o relatório, a foto de faixas pedindo a redução da pobreza naquele país tão invejado por nós!

Aliás, sobre pobreza e crianças, que tal destruirmos de vez nossas ilusões? Vamos lá: 25% das crianças norte-americanas abaixo dos 12 anos de idade passam fome. Na Inglaterra, 10% das crianças são extremamente pobres e vivem à margem da sociedade. Na França, 8% dos menores de 18 anos são pobres e não tem abrigo ou educação. Na Alemanha, uma a cada sete crianças de até 15 anos de idade vive na pobreza. Na Europa toda, 16% da população vive abaixo da linha da pobreza. Admitamos: não nos ensinaram nada disso aqui no Brasil – e muito pelo contrário!

E a assistência à saúde? Inglaterra, um passo à frente: a escassez de leitos em hospitais e maternidades tem feito com que a cada ano quatro mil inglesas realizem seus partos em ambulâncias, corredores, recepções, elevadores e até banheiros! Quem diria!

Diante destes exemplos, talvez seja o momento de compreendermos que o mundo já não é mais aquele que nos descreveram desde a infância, e a partir daí reavaliarmos nossas opiniões sobre a posição que nele ocupa e deveria ocupar o nosso país. Afinal, como ensinava Benjamim Disraeli, “ter consciência da própria importância já é um passo para o saber”.

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