Os valores de lá e os de cá

O Japão é um país pequeno e pobre, que não produz uma única gota de petróleo. O Brasil é um país imenso e riquíssimo, auto-suficiente em petróleo, e que já ambiciona até entrar para a OPEP. Os japoneses estão revoltados, segundo li no jornal Asahi, porque o litro da gasolina pura subiu para R$ 2,73. Os brasileiros estão pagando, em silêncio, R$ 2,89 pela gasolina misturada com álcool que mais se aproxima do padrão da de lá.

O Japão não produz um único quilo de minério de ferro. O Brasil é um dos maiores exportadores de minério de ferro do mundo. É só olhar para os portos e ver nosso minério (uma riqueza não-renovável) sendo exportado dia e noite, sem parar. Com este minério de ferro importado daqui o Japão fabrica um automóvel e o vende por R$ 41 mil. Este mesmo carro é vendido aqui por R$ 94.500.

O Japão é atormentado por terremotos. Isto encarece as construções – sem contar que lá há escassez de cimento, ferro, etc., e que a mão-de-obra é caríssima. Li no jornal Japan Times que o preço médio de um apartamento em Tóquio está em 5,2 vezes o salário anual médio de um trabalhador. O Brasil é imenso e livre da praga dos terremotos. Isto reduz o custo das construções – sem contar que nossa mão-de-obra é das mais baratas do mundo e que há matéria-prima à vontade. Aqui, um apartamento com dois dormitórios em algum subúrbio de São Paulo equivale a 7,2 vezes o salário anual médio de um trabalhador.

No Japão a assinatura de um plano de telefonia residencial completo, com internet de alta velocidade, identificação de chamadas, chamada em espera, transferência de ligações, serviço de bloqueio de telefonemas inconvenientes e envio de e-mail de notificação de chamadas custa R$ 23,89 (valores da NTT East Hikari Denwa). No Brasil, pagamos em média R$ 39,00 pela assinatura básica de um telefone residencial.

No pequeno e pobre Japão considera-se como “salário médio de um trabalhador” o valor de R$ 10.186,50 (área de Tóquio). No imenso e riquíssimo Brasil, segundo o IBGE (2006), este mesmo “salário médio” situa-se em torno de R$ 1.034,70.

Escolhi o Japão como parâmetro ao acaso. Poderia ter escolhido a Suíça (também um país miserável, sem riquezas naturais), a Coréia do Sul (outro lugar pobre, devastado por guerras) ou a Alemanha (até poucos anos destruída e ocupada por quatro países estrangeiros) e os números não se alterariam tanto.

Realmente não dá para entender. Todos os países que citei, pobres ou devastados por guerras e desastres, se desenvolveram maravilhosamente. Enquanto isso o Brasil, um país riquíssimo em tudo e que vive em paz, tem alguns dos preços mais altos do mundo e salários quase que humilhantes, tudo fruto de uma economia baseada praticamente no extrativismo, na exportação de recursos naturais no mais das vezes não-renováveis e esgotáveis.

A quem pensar que “estamos nos modernizando”, recomendo cautela: o Brasil não é capaz, ainda, de fabricar uma mera calculadora de bolso – falta-nos até uma singela “fábrica de chips”, quadro este que nos reduz no mais das vezes a meros “montadores”. Para piorar, a maior parte do nosso pequeno parque industrial genuinamente nacional foi vendida para estrangeiros, que aqui estão a nos vender desde o leite de nossas próprias vacas até a água de nossas próprias nascentes.

Nossa riqueza de recursos naturais é boa. Mas não basta. Não podemos mais viver do extrativismo.  Há 500 anos temos uma economia baseada na exportação de nossas riquezas naturais a preço de banana e na importação de bens industrializados a preço de ouro. Até quando nosso país suportará isso? Até quando nosso povo suportará isso?

Talvez seja este o momento certo de nos lembrarmos da advertência de Thomas Fuller: “enquanto o poço não seca não sabemos dar valor à água”.

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