Será que os presos têm jeito?

Fábio, um ser humano, um semelhante nosso, nascido em um bairro pobre lá do Rio de Janeiro, cresceu vendo cenas de violência, tráfico de drogas e afins. Só o que ele não via era a ação do Estado. E foi assim que, ao invés de aulas de Geografia ou História, Fábio só teve lições de tiro e luta armada. Saúde e Justiça? Só aquelas fornecidas pelos traficantes. A infância dele bem mereceria uma paródia de Castro Alves: “Estado, ó Estado, onde estás que não respondes, em que mundo, em que estrela tu te escondes”?

Aos 17 anos de idade, lá estava o Fábio participando de guerras pelo controle do tráfico de drogas em sua região, buscando uma “posição de respeito e sonho”. Quando a situação ficou complicada, fugiu para o Espírito Santo. Com ele vieram o vício e os efeitos da falta do Estado: instrução deficiente e exemplos ruins. O resultado: Fábio acabou preso.

Na prisão Fábio passou a viver, como ele próprio definiu, “cercado por criminosos de todos os tipos, assassinos cruéis, traficantes, estelionatários, assaltantes de banco, etc., ou seja, uma verdadeira escola do crime e como um bom aluno que sempre fui me empenhei em absorver todo conhecimento em minha volta, aprendi a dar golpes, transformar pasta-base em cocaína e criar métodos e estratégias de assalto”. O cotidiano da cadeia? Valho-me de suas palavras: “rebeliões, mortes, greves de fome, espancamento e tédio era tudo que tínhamos e parecia ser o que sempre teríamos”.

E as perspectivas de futuro? As palavras dele: “com razão a Sociedade não mais me aceitaria, me discriminaria porque no momento em que fui preso a Justiça me carimbou mais um número que mostraria para todos quem eu era, mais um presidiário que a população tinha medo que fosse solto”.

E eis que um dia a liberdade chegou. O que fazer com ela? Fábio planejava “cometer um grande assalto e parar, traficar alguns quilos de cocaína e construir sua vida ou aplicar alguns golpes”. Afinal, era tudo o que ele tinha aprendido na vida – ora pela omissão do Estado, ora com a própria ajuda deste lá no presídio. Fábio não saiu da prisão para vida nova alguma – tudo o que o esperava era sua “vida velha”, com os mesmos problemas e influências ruins.

E eis que apareceu um anjo na vida do Fábio: sua esposa. Seguiu-a sua família. E foi assim que, cercado de carinho, viu-se o Fábio recebendo alguns trocados para carregar lenha em uma padaria. Pouco depois, já era ajudante de padeiro. Passado algum tempo, um canto alugado, um fogão de 6 bocas usado e um balcão emprestado se transformaram na Padaria do Fábio. O capital inicial? R$ 23 – foi quanto custou o material necessário para começar o negócio. As dificuldades foram muitas, mas quando Fábio fraquejava “lá estava a esposa com um sorriso maravilhoso incentivando a prosseguir”. Hoje, Fábio é microempresário, tendo uma padaria totalmente equipada, na qual vende em média 1,5 mil pães por dia. Para isso, ele só precisou de duas coisas: incentivo e oportunidade.

A Fábio, lá no fundo o fruto de um Estado hipócrita, covarde e ausente, é de ser dedicada a oração de um dos maiores criminalistas da História, Francesco Carnelutti: “Ir até os réus é a solução do problema. Não fugir deles; mas correr a seu encontro, como São Francisco. Não mirá-los de cima para baixo, mas descer do cavalo e adaptar-se a eles, como São Francisco. Não fixar os olhos em sua deformidade; mas afastar a vista, como São Francisco. Não tapar a cara, por temer o contágio; mas beijar-lhes na cara, como São Francisco. Não detestá-los como inimigos, não dar-lhes chibatadas como a cachorros, não pôr-lhes ao pescoço a campainha do leproso. Sua enfermidade não é mais do que fome e sede, frio e solidão. O alimento para tirar-lhes a fome, a água para tirar-lhes a sede, o tecido para vesti-los de novo, a casa para alojá-los é nosso amor. O antídoto contra o mal é o bem. E esta medicina milagrosa não é daquelas que os homens devam buscar com fadiga ou pagar a peso de ouro; não é necessário, para ser encontrada, mais do que amor. Por isso, na luta contra o crime, é fácil conquistar a vitória, sempre que os homens escutem a última palavra do Mestre: amais como eu vos tenho amado”!

Enviar por e-mail Imprimir