Telefone celular e trânsito

Dia desses deparei-me, em dada publicação, com curiosa estorieta, narrada “em quadrinhos” por um habilidoso desenhista.  Tudo se passa no interior do “Museu do Automóvel”, onde alguns turistas, conduzidos por um guia, se deleitavam com o estudo das origens do automóvel.  O primeiro cenário visto é sucinto: um macaco, simbolizando a origem mesma do ser humano.  Em seguida, um homem pré-histórico, às mãos uma roda de pedra.  Logo após, o carro de boi.  Segue-lhe a biga romana.  Aparece, então, o “calhambeque”.  Chegam os “carrões” dos anos 50, e os econômicos “carrinhos” dos anos 70.  Torna-se, então, à atualidade, e todos os turistas, aí já embasbacados com o “estado da arte” alcançado, a partir de um grotesco macaco, demonstram seu deslumbramento.

Encerra a exposição o “carro do futuro”, inspiração dos cientistas para os próximos anos.  Encerrada a visita ao museu os turistas, já aí felizes e entusiasmados com o progresso da raça humana, embarcam no ônibus que os conduzirá de volta às suas casas.  O motorista do ônibus?  Ninguém menos que aquele macaco exibido logo à entrada do museu…

O fato é que, de forma jocosa, o autor daqueles “quadrinhos” retratou uma verdade: temos pelas ruas umas tantas maravilhas tecnológicas sendo conduzidas por algumas pessoas cujo nível civilizacional não permitiria que a condução de “carros de boi”.

Na esteira desta realidade, de nível mundial, bom é que se diga, recusa-se a desaparecer um já velho hábito: o uso de aparelhos de telefonia celular por condutores de automóvel, em resistência às mais elementares leis de trânsito.

Abordando este hábito, um vasto estudo, realizado em Toronto (Canadá), e publicado no periódico americano “The New England Journal of Medicine”, acabou por concluir o quão arriscado é o uso de telefones celulares nos veículos – em uma expressão, e sintetizando o estudo, o risco de colisão é multiplicado por cinco, em média.

Este trabalho, conduzido pelo Dr. Donald A. Redelmeier (Universidade de Toronto, Canadá), reuniu um grupo de 700 motoristas, proprietários de telefones celulares, e implicados em acidentes.  Foram analisadas, a partir dos extratos detalhados das contas telefônicas, as ligações de cada um dos pesquisados no dia da colisão.  O estudo computou um total aproximado de 27.000 chamadas por telefone celular durante 14 meses.  Ele conclui que o risco de colisão durante a utilização de um telefone deste tipo é 4 vezes mais elevado que o normal.  O risco é 6 vezes mais elevado nos primeiros 5 minutos de conversação.

Explicando o fenômeno, estimam os especialistas que esta prática reduz em 0,5 segundo ou mais as reações e reflexos do motorista, e que, se a distração induzida pelo uso do telefone for da mesma ordem daquela oriunda da atividade de busca de estações de rádio (hipótese mais branda, de uma conversa amena), acarretará, já, uma condução notavelmente mais imprecisa.

Os autores anotam, também, não sem uma pitada de ironia, que 39% dos motoristas, logo em seguida à colisão, encerraram a ligação que faziam, utilizando o telefone para chamar os serviços de urgência.

De toda sorte, concluiu-se, a partir deste trabalho, que entre 6 e 12% dos acidentes de trânsito são, atualmente, causados pelo uso deste tipo de telefone.

Diante destes dados, nunca tão oportuno aos nossos motoristas o ensinamento secular de Pitágoras, segundo quem “a prudência é o olho de todas as virtudes”.

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