As vítimas de Nice

Todos acompanhamos, com justificado horror, a cobertura jornalística relativa ao brutal atentado terrorista levado a efeito na cidade francesa de Nice. Ao longo de diversos dias fomos informados sobre o número de mortos, quais suas nacionalidades etc.

Mas faltou algo! Considerado o espaço dedicado ao tema no Brasil, e bem assim nossa realidade, esteve ausente uma informação digna de reflexão por cada brasileiro. Refiro-me ao notável anúncio feito por Juliette Méadel, Secretária de Estado encarregada da assistência às vítimas.

Vejam só: poucas horas depois do atentado ela foi a público declarar que o Estado “velaria por que as vítimas, não importa se diretas ou indiretas, fossem indenizadas”. Anunciou, em seguida, que já na semana seguinte estariam sendo indenizadas as primeiras delas.

Ela não estava simplesmente lançando palavras ao vento – os recursos para tais indenizações existiam desde 1990, quando foi criado, pelo governo francês, um fundo destinado a indenizar vítimas de crimes.

Denominado “FGTI”, este mecanismo é alimentado, em 75%, por uma contribuição de € 4,30 (em 2016) prevista sobre a assinatura de cada contrato de seguro de bens firmado em solo francês. O restante vem de ações movidas contra os autores de crime e aplicações financeiras.

A filosofia deste fundo é tão simples quanto nobre: cada cidadão deve ter a certeza de que, em sendo vítima de algum crime, não verá a si ou a sua família na triste vala do abandono – estará ao seu lado, ou ao lado dos entes queridos que deixara, o Estado. Notável, isso!

Enquanto isso, aqui neste tão rico Brasil, pródigo em distribuir “bolsas” e “auxílios”, a Constituição Federal previu, em seu artigo 245, que “o Poder Público dará assistência aos herdeiros e dependentes carentes de pessoas vitimadas por crime doloso”.

Pois é. Nossa Carta Magna, a “Constituição Cidadã”, data de 1988. Já se vão quase 30 anos! E não se tem notícia sequer da regulamentação deste direito tão básico! Nossas vítimas – e não só as carentes – continuam largadas ao desamparo, muitas encontrando, em vez da assistência do Estado, a miséria e a desesperança.

A não ser que, por um esforço interpretativo, os doutores do Brasil tenham concluído que as vítimas já tem o direito de ligar para o 190 – e estaria aí a assistência constitucional!

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