Exemplo a ser observado

Há poucos dias li no jornal The Times, do Reino Unido, os resultados de um inacreditável levantamento acerca do que ladrões roubam da Polícia daquele país.

Noticiou-se que em Warwickshire um ladrão furtou o Código de Procedimentos Policiais de uma viatura, e em Derbyshire o revestimento externo das paredes da Delegacia de Polícia foi carregado por desconhecidos. Enquanto isso, a Polícia de Wiltshire viu desaparecer o micro-ônibus de sua Delegacia. Em Dorset, um ladrão impiedoso carregou da Delegacia de Polícia a caixa de doações beneficentes, na qual os policiais depositavam parte de seus salários para caridade.

Quem também não teve piedade foram os ladrões que carregaram os dois cães policiais da Delegacia de Lancashire. Talvez o almoço destes dois caninos tenha sido providenciado pelos larápios que afanaram pedaços de carne da despensa da Delegacia de Manchester. E talvez esta carne tenha sido transportada na maleta furtada da Delegacia de Humberside. E que dizer dos policiais de Kent, que ficaram pasmos ao constatarem que os arbustos que decoravam a frente da Delegacia de Polícia evaporaram?

Há também o caso do ladrão que, com dor-de-cabeça, desapareceu com o estoque de comprimidos da Delegacia de Avon & Somerset. A coisa anda tão feia que até uma amostra de sangue foi furtada de dentro de uma viatura de polícia estacionada nas ruas de Norfolk. A propósito, percebe-se que as viaturas da polícia britânica têm recebido a preferência dos ladrões: calculou-se em milhares o número de maços de cigarro carregados de dentro delas, enquanto os policiais atendiam alguém. Aliás, pior foi em Manchester, onde a própria viatura policial foi carregada pelos “amigos do alheio”.

Nos últimos três anos, calculou-se que ladrões carregaram quase R$ 420 mil em equipamentos da Polícia de West Midlands, R$ 190 mil da de Wiltshire e R$ 160 mil da de Manchester. Já a Polícia Metropolitana relatou ter sido vítima de 119 furtos e roubos no mesmo período, perdendo inclusive 15 uniformes, e a de Manchester teve roubados quatro pneus e até uma espada de samurai! Mas talvez o episódio mais incrível seja o de uma prisão de Londres que, após ser invadida por ladrões, teve seu cofre arrombado!

De todos estes crimes contra a Polícia, apenas 30% foram apurados – os demais permaneceram impunes. Vamos, agora, às conseqüências que esta desmoralização traz para a Sociedade como um todo, noticiadas pelo também britânico jornal The Guardian: “97% dos crimes jamais são apurados”. Por conta disso, cito o exemplo de que “apenas 0,86% dos estupros cometidos em Gloucestershire foram punidos” (jornal The Times). Toda esta impunidade tem um preço, conforme constatou pesquisa divulgada pela rede BBC News: “50% dos comerciários ingleses já tiveram que se afastar do serviço em função da violência”, e “uma em cada 20 mulheres da Inglaterra já foi estuprada em algum momento da vida”.

Dada a notória riqueza do Reino Unido, é surpreendente esta chocante realidade, que talvez comece a ser explicada por duas outras notícias que li nos noticiários ITN e Sky News, ambos igualmente ingleses.

A primeira: “Um dos mais antigos Chefes de Polícia declarou que seus agentes gastam apenas 6 minutos por hora combatendo o crime”. Segundo ele, “a burocracia consome 90% do tempo dos policiais”. Para melhorar este quadro, sugeriu-se a simplificação das regras processuais e o uso mais intenso de tecnologia.

Já a segunda notícia, igualmente séria, trazia uma declaração de Sir Ronnie Flanagan, Inspetor-Chefe da Polícia, no sentido de que os policiais trabalham a cada dia mais acuados, com medo de represálias e processos. E concluiu pela necessidade de uma mudança cultural que encoraje os policiais a redescobrirem as suas funções.

Talvez, diante da absurda realidade vivida pela população inglesa, devesse o Brasil prevenir-se, recordando o conselho de um de seus mais brilhantes filhos, Oswaldo Cruz, segundo quem “pelas faltas dos outros, o homem sensato corrige as suas”.

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