Onde fica a prisão de Guantánamo?

Há poucos dias tive a oportunidade de ler uma interessante entrevista da escritora Mahvish Khan, publicada na revista Superinteressante. Trata-se de uma norte-americana que funcionou como intérprete na famosa prisão de Guantánamo, mantida pelos Estados Unidos da América em uma área de Cuba.

Eis o chocante resumo de seu testemunho sobre as condições em que encarcerados os presos naquele estabelecimento: “A maioria fica presa sozinha em celas de concreto de 2,10 m x 2,40 m – o tamanho de um colchão King-Size. Ali ficam a cama, o banheiro e a pia. Eles comem e rezam sozinhos. Muitos não veem a luz do Sol durante meses, porque só podem sair uma hora ou menos por dia, no meio da noite. Vários são submetidos a buscas nas cavidades do corpo [por drogas e armas] na frente dos outros. Também são confinados sob frio ou calor extremos”.

Todos os brasileiros aplaudiram com entusiasmo e alívio a ordem de fechamento desta prisão, assinada há poucos dias. O mundo todo repudiou as condições em que seres humanos foram trancafiados nas celas daquele estabelecimento, distantes dos seus familiares e desprovidos dos mais básicos direitos humanos.

Enquanto isso li em um jornal brasileiro, não faz muito tempo, a seguinte notícia: “A Justiça manda soltar um rapaz de 120 quilos. Agentes penitenciários tremem. Como a porta da cadeia está selada a solda desde a rebelião, eles já sabem que o único jeito de tirá-lo de lá é pelo teto, içando-o por mais de quatro metros até uma grade. A “pescaria” quase acaba em tragédia, quando os quatro agentes encarregados da missão, sem agüentar o peso, soltam o “peixão”, que se estatela no chão. Até ontem, quatro presos conseguiram sair içados. A alimentação é jogada por cima, todos os dias, às 11 e às 17 horas, pela mesma grade por onde saiu o preso gordinho. Banheiros há 13, ou 123 aparelhos excretores para cada privada. A saída é defecar em sacos plásticos (várias vezes em um mesmo saco), que são empilhados em um canto do local. Não há luz”.

E narrou ainda o repórter: “Muitos presos estão doentes. Outros estão ficando. Mantidos seminus, dispõem apenas de cobertas finas e são obrigados a dormir uns encostados nos outros. Foi o jeito que deram para contornar o inverno que faz os termômetros da região baixarem para a casa dos 10 graus centígrados”.

Pouco tempo depois a imprensa noticiava o caso de uma Delegacia brasileira cuja cela, de dois metros quadrados, estava sendo utilizada para armazenar (sim, armazenar – há outro termo possível diante de uma situação dessas?) nada menos que 39 seres humanos. Uma outra, com vagas suficientes para 36 pessoas, armazenava inacreditáveis 254 detentos.

Na mesma época divulgou-se uma pesquisa segundo a qual a população carcerária tem índices de AIDS 57% superiores aos do restante da sociedade, e apresenta 10 vezes mais casos de hepatite B, hepatite C e sífilis. Uma pesquisa sobre os presos em Manaus revelou que 41% deles tinham problemas de saúde, quase a metade deles doenças respiratórias e outros 11% problemas digestivos. Um outro estudo, realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo, demonstrou que 18% dos presos da Casa de Detenção tinham sífilis. Constatou-se, igualmente, que 80% da população carcerária masculina e 90% da feminina são portadores do bacilo da tuberculose. Para piorar, não há atendimento médico-hospitalar dentro da maioria das prisões, e as remoções para hospital dependem de escolta e autorizações judiciais concedidas no mais das vezes tarde demais.

Há poucos dias um presidiário foi assassinado e esquartejado dentro de outro presídio brasileiro. Os pedaços do corpo dele foram encontrados dentro de uma lata de lixo. Vinte e dois longos dias depois sua mãe, inconformada, a caminho do enterro, fez questão de parar diante das sedes de diversas instituições. Em cada uma destas paradas ela retirava do caixão um braço, uma perna ou a cabeça do filho, sacudindo-a com as mãos e gritando “vejam o que o Estado fez com o meu filho”.

Guantánamo… onde fica mesmo esse lugar?

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