Da recessão

Há mais de cem anos os teóricos e ideólogos do comunismo vêm divulgando e defendendo o ponto de vista que o crime teria como causa unica e exclusiva o fenômeno econômico. Grandes e acalorados debates foram travados, mas, como se martelava constantemente na mesma tecla, tornou-se quase um dogma essa tese.

Hoje em dia, após a queda do muro de Berlim e o consequente desmoronamento do comunismo, a matéria volta a ser examinada, e em inúmeros Congressos sobre Direito Penal e Criminologia, realizados através do mundo, já se fala sobre o surgimento de um “neolombrosianismo” e da interferência de vários outros fatores para o surgimento do fenômeno “crime”.

Clovis Bevilacqua, o grande jurista brasileiro, escreveu e provou com dados estatísticos incontestáveis, em seu livro “Criminologia”, que a criminalidade no nordeste diminuía consideravelmente na época em que a região era assolada pela seca e grande parte da população achava-se mergulhada na mais extrema miséria.

Com efeito, o nordestino, fraco e combalido pela fome, não tinha ânimo para assaltar, roubar, praticar estelionatos, e, muito menos, para cometer estupros e outros crimes sexuais.

Além disso, não há apenas crimes contra o patrimônio: podemos citar os criminosos loucos; os autores de crimes políticos; os fanáticos, que cometem crimes religiosos; os apaixonados, com seus crimes passionais; os cleptomaníacos, que, independentemente de sua condição econômica, descambam incontrolavelmente para furtos; os tarados sexuais, etc., etc.

Mas, dentro da área dos crimes patrimoniais, já se acha provado cabalmente pela criminologia moderna, que não é a pobreza a maior causadora da criminalidade. É a recessão econômica.

O indivíduo que conseguiu alcançar na vida um certo padrão de vida – que tem casa, carro, geladeira, televisão, família bem constituída, é acostumado a viajar, gozar férias e ocasionalmente comer em bons restaurantes – prefere matar, roubar, morrer, a regredir em seu “status” social.

Enquanto o pobre, que sempre viveu na favela, privado de toda e qualquer condição de conforto, mergulhado na tristeza e no sofrimento, na maioria das vezes não se sente propenso ao crime, encontrando consolo na religião, no carnaval, e nas pequenas alegrias da vida, aqueloutro, que avançou socialmente, passando a se vestir bem, e já estava habituado a andar de carro, muitas vezes prefere se suicidar, a retornar às suas origens.

Por isso temos visto ultimamente no nosso País assaltos a Bancos e a empresas importantes, em que os assaltantes aparecem devidamente arrumados, com pastas, telefone celular à mão e instrumentos sofisticados para abertura de portas e arrombamento de cofres.

Ora são cometidas fraudes nos computadores, ora são as fraudes nos cartões de crédito, ora vítimas são ludibriadas em caixas eletrônicos, ora mercadorias são desviadas em armazens alfandegários ou em firmas importadoras, através documentos ardilosamente falsificados.

Em todos esses tipos de crimes nota-se o alto nível intelectual dos agentes. Na maioria das vezes são desempregados, homens que trabalhavam no ramo, despedidos por força da recessão econômica, que aplicam no crime tudo aquilo que aprenderam no exercício de suas atividades profissionais.

Chama a atenção, também, o cuidadoso planejamento desses crimes. Tudo é previsto, traçado e elaborado meticulosamente.

E um fator importante a ser analisado é que, como não se trata de criminosos profissionais, às vezes só cometem um ou dois crimes, largando logo em seguida a atividade criminosa. Daí a razão por que dificilmente são encontráveis.

Há alguns anos houve o sequestro de um Diretor do Bradesco, que acabou liberado mediante o pagamento de uma elevada soma de resgate. Nunca se conseguiu descobrir os sequestradores, por mais que fossem procurados. Por que? Possivelmente porque os autores, além de inteligentíssimos e bem preparados, não eram criminosos habituais nem profissionais, tornando-se dificílima ou quase impossível sua identificação.

Neste e em inúmeros casos semelhantes, evidencia-se a atuação de um cérebro lúcido, acostumado a traçar e orientar suas atividades, com experiência e segurança.

Infelizmente, enquanto nosso País – tão grande e tão rico – vive se ajoelhando aos pés do FMI e de outros órgãos internacionais em busca de empréstimos e mais empréstimos, nossa recessão econômica agrava-se, e procura-se combater a elevadíssima taxa de criminalidade através a elaboração de leis e mais leis em profusão.

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