Das reformas estruturais

Qualquer um que estava vivo pelos idos de 1962, 1963 e princípios de 1964 deve se lembrar de que a tônica de todos os pronunciamentos, de todos os debates, de todas as discussões de todo mundo em todos os lugares era a necessidade inadiável, urgente, urgentíssima das reformas.

Os oradores, polemistas, escritores e jornalistas, não perdiam chances de apoiarem os Parlamentares e políticos que descambavam pelo programa reformista, apontando a exigência do povo de reforma agrária, tributária, eleitoral, administrativa, urbana, etc., etc.

Deputados e Vereadores, Senadores e Ministros, desde os de pequena cabotagem até os de largas navegações pelos mundos da política abriam as goelas ao vento citando metódica e sistematicamente frases de Lebret, da Conferência dos Bispos ou do Congresso Desenvolvimentista, pensamentos de Kennedy, do Papa João XXIII, dados estatísticos da FAO, da ONU e da OEA, tudo sob o diapasão da inadiabilidade da ação reformadora.

O assunto foi de tal maneira realejado em prosa e verso que a revolução estourou aos 31 de março no meio de um festival de reformas, do qual participavam comuno-peleguistas, mas também intelectuais, homens de cultura e clarividência, bem intencionados e amantes da Pátria estremecida.

O novo Governo, quando assumiu, sentiu-se no dever de atender aos reclamos da opinião pública, pelo menos nas promessas, afiançando que a Revolução não fora feita para impedir as reformas, e que todas elas seriam feitas sob a égide dos ideais revolucionários. Reformas cristãs e democráticas.

Dito e feito. Mensagens à pamparra, Leis às pororocas, de todos os tipos e de todas as formas. Todas elas aprovadas às carreiras, com Deputados e Senadores disputando verdadeiro campeonato de fidelidade, cada um querendo parecer mais reformista do que o outro.

Foi colocado em vigor o Estatuto da Terra, de elaboração do saudoso Fernando Ferrari; aprovadas e sancionadas as Leis da Reforma Agrária, Reforma Urbana, Reforma Eleitoral, Reforma Bancária, etc.

Restabelecida a democracia no País, retornaram as preocupações obsessivas com a necessidade de reformas inadiáveis, imprescindíveis, imprescritíveis, essenciais, fundamentais, dentre as quais avulta-se a do Judiciário.

Enquanto isso, passemos uma vista d’olhos sobre o funcionamento da Justiça nos Estados Unidos, a única superpotência mundial, cuja pujança econômica só é ultrapassada pelo seu poderosíssimo e incontrastável arsenal bélico.

Assim, lemos na Imprensa:

– “A cidade americana de Portsmouth, em New Hampshire, está revoltada. O Tribunal local condenou à morte o cão labrador Prince. Motivo: ele foi flagrado vagando sozinho pela cidade. Desde que matou um galo em maio do ano passado, Prince estava proibido de andar desacompanhado. A infração não foi perdoada pelo juiz, mas o advogado do cachorro, Peter Marsh, conseguiu protelar a sentença da execução para a quarta-feira 12” (Isto é – Nº 1428).

– A Suprema Corte dos Estados Unidos vai analisar uma apelação no caso de um homem condenado à morte, em 1979, no Texas, e que se encontra preso até hoje (Jornais nacionais de 28.11.2000, inclusive “A Tribuna” dessa data).

E, finalmente, não custa relembrar o incrível fenômeno das eleições presidenciais norte-americanas, em que o resultado final vai se postergando através de recursos, recontagens e decisões judiciais e extra-judiciais, surpreendendo e estarrecendo o mundo, especialmente os subdesenvolvidos – quando vemos que, recentissimamente, no nosso País as apurações foram concluídas em menos de 24 horas após o pleito.

Parece até que tem razão o Professor Haines, americano de boa cepa, escritor sob todos os títulos imparcial, quando diz e sustenta em sua magnífica obra que os americanos quando não querem emprestar dinheiro ao Brasil, ou pretendem retardar os financiamentos, começam a exigir reformas e mais reformas, muitas delas impossíveis, e a maioria delas controvertidas e criadoras de grandes polêmicas.

Porque, à primeira vista, tudo leva a crer que quem está precisando de uma reforma do Judiciário urgentissimamente talvez sejam exatamente os Estados Unidos, antes de mais nada no que se refere às apurações eleitorais.

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