Dos partidos políticos

Desde as mais antigas sociedades cultas e organizadas a História registra a atuação de grupos de pressão e grupos de interesse junto à formação, estruturação e direção do Estado.

Cita-se na Grécia o conflito entre os “dedianos” e os “paralianos”, sendo os primeiros contrários às reformas democratizantes de Sólon, e os segundos, adeptos da igualdade de direitos entre patrícios e plebeus, lutando pela “isotelia”, que compreendia, inclusive, a imposição aos deveres do serviço militar e ao pagamento de impostos para todos, indistintamente. “Diacrianos” eram os pobres camponeses, que compunham a classe menos favorecida.

Esses mesmos “partidos” havia em Roma, onde de um lado estavam os “patrícios” que eram os Senhores e “Cavaleiros”, que dominavam o Senado, também chamados de “optimates”, e do outro lado, os plebeus, seguidores dos Gracos, aspirando a reformas e transformações na estrutura social que lhes dessem mais direitos.

A existência desses “partidos” informais, ou seja, partidos de fato, sem vida jurídica própria, nota-se nitidamente na Idade Média, nas Cortes absolutistas e no feudalismo, em que o Príncipe nunca deixava de ouvir previamente, e com atenção, as “forças sociais” antes de deliberar.

Marca muito forte dessa presença de vida partidária naquela época, temos com a imposição, pelos Barões, na Inglaterra, de uma Constituição, a João sem Terra, em 1215 – a “Magna Carta”, que pode ser considerada a primeira Constituição escrita no mundo. Fruto, naturalmente, de uma vitória do partido da oposição sobre o do Governo.

Essas tendências ideológicas, que exercem influência preponderante na condução das atividades políticas de um Estado, apareceram com muita vitalidade nas antevésperas da Revolução Francesa. Premido pelas circunstâncias, Luís XVI convocou os “Estados Gerais”, ou seja, os representantes do povo, através de suas classes: a nobreza, o clero e o “terceiro Estado” (plebe ou pequena burguesia), a fim de, reunidos, discutirem a situação econômica, financeira e política do País. Foi daí que surgiu a “Assembléia Nacional” – o Parlamento francês.

Nas sessões dos Estados Gerais, os conservadores constumavam sentar-se à direita do Presidente; os reformistas e inconformados à esquerda; e os chamados “da planície” (porque as cadeiras eram dispostas em escala à direita e à esquerda, havendo um centro no nível do chão) aceitavam uma posição intermediária, acomodando idéias transformistas com as teses conservadoras.

A partir de então vulgarizaram-se as expressões “direitistas”, “esquerdistas” e “centristas”, ou “de direita”, “de esquerda” e de centro”, conforme o cidadão ou político adote um posição conservadora, evolutiva ou eclética. Vieram em seguida designações centro-esquerda, centro-direita, ultradireitista, ultra-esquerdista, conforme a pessoa seja de centro, com tendências para a esquerda; de centro, com tendências para a direita; radical de direita; ou radical de esquerda (revolucionário, subversivo, e, mais recentemente, “xiita”). E os confusos, que se declaram “de centro-esquerda, com tendências para a direita”.

Não obstante todo esse curso histórico, só se dá, porém, o aparecimento de partidos políticos verdadeiros, autênticos e com a conformação atual, em 1832, na Inglaterra. O País achava-se dividido entre os “tories” (conservadores) e os “whigs” (liberais), quando naquele ano foi editado o “Reform Bill” (Lei de Reforma), prevendo a formação das “Registration Societies”, ou seja, sociedades registradas que representariam correntes de opinião pública e lutariam pela defesa de seus interesses e programas, o que não era nada mais nada menos do que partidos políticos.

Os cronistas ressaltam a atuação de Robert Peel, parlamentar e político eminente daquela época, que chegou a Primeiro Ministro. Compreendendo a importância e significação da vida partidária e o que ela representaria, passou a estimular e incentivar o povo a se filiar às sociedades registradas.

“Tories” e “whigs” foram se formando a partir de alistamento a nível de quarteirão, bairro, distritos, condados, até abrangerem toda a Nação. Sempre fizeram parte da tradição inglesa, sem interrupção alguma. Deles saíram os “Republicanos” e “Democratas”, dos Estados Unidos, que no fundo, em seus conflitos corporificam apenas o eterno choque entre as tendências conservadora e liberal da sociedade.

Se os partidos políticos nasceram na Inglaterra, consolidaram-se nos Estados Unidos, pois que, com a implantação do regime presidencialista criou-se o direito das convenções partidárias escolherem os candidatos, partindo daí todas as demais, caracterizando o Partido como órgão integrante do Estado.

Na Rússia, durante o período anterior e posterior à Revolução de 1917, lutavam “mencheviques” e “bolcheviques”, sendo aqueles mais conservadores e estes revolucionários. Por isso, vitorioso o partido dos bolcheviques e implantado o regime comunista – como pretendiam – as palavras “bolchevistas” e “comunistas” passaram a ser adotadas com o mesmo sentido, como sinônimos.

A partir da consolidação do bolchevismo na Rússia, não consentiu este que continuassem a existir outros partidos. Acolhendo a teoria de Marx, Engels e Lenine, entendiam os bolcheviques que, se representavam a totalidade do povo, era inadmissível a existência de “partes”. Assim o Partido Comunista passou a ser o único permitido.

A perniciosa idéia do Partido único, autoritário, absorvente, “de massas”, encontrou logo adeptos em inúmeros Estados totalitários que se constituíram pelo mundo afora: Alemanha (Partido Nacional-Socialista ou “nazismo”); Itália, com o fascismo; Espanha com o franquismo; Portugal, com o salazarismo; Brasil com o getulismo; Argentina com o peronismo etc. Eram os partidos autoritários, na definição de Maurice Duverger.

Mas, apesar dessa formas anômalas e exóticas de vida partidária, democracia, como dizia Kelsen, “é necessária e inevitavelmente, um Estado de partidos”. Não se pode conceber democracia, no sentido exato da palavra, com a imposição de partido único. No unipartidarismo as diversas tendências da sociedade não encontram escoadouro. Os partidos são o respiradouro da vida democrática. É através deles que surgem e se movimentam as idéias. O pluripartidarismo seria a outra face de uma mesma moeda. “Democracia” sem pluripartidarismo não é democracia, mas sim simulacro de democracia.

Por isso, neste mês de Convenções partidárias, ficamos satisfeitos quando constatamos essa magnífica demonstração de vitalidade democrática em nosso País.

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