Dos regimes

Uma das mais belas páginas da História Universal foi, sem dúvida alguma, aquela escrita pelos gregos na antiguidade clássica. Michelet dizia que “mais filósofo do que Sócrates, só o povo grego; mais irônico do que Voltaire, só o povo francês”.

Infelizmente o catastrófico incêndio da biblioteca de Alexandria destruiu todas as obras do mundo antigo e só se tem notícia de muito pouca coisa. Consta, inclusive, que Aristóteles, Sócrates e Platão não foram os maiores filósofos gregos, mas dos menores. A maravilhosa obra dos demais desapareceu, consumida pelas chamas.

Como a Grécia era formada por centenas de ilhas, seus habitantes iam inventando e constituindo Estados de acordo com suas conviências e sua inesgotável capacidade criadora.

Assim, surgiram como criação do gênio grego: 1. As monocracias, ou seja, governo de um só. Sua escolha era feita pelo povo, reunido em Assembléia; ou pelos representantes do povo. 2. As aristocracias – governo de um grupo de pessoas, consideradas “as melhores”. 3. As democracias – domínio de todo o povo. Era o chamado governo “do povo, para o povo, pelo povo”. 4. O despotismo – governo arbitrário de um só. 5. A oligarquia – governo arbitrário de uns poucos. Quem mandava no País era um pequeno grupo. 6. Oclocracia, ou, em outras palavras, a demagogia – governo “da plebe”, mas, na realidade, governo dos demagogos, assim designados aqueles que sabiam insuflar a excitar a massa ignara com suas mentiras e interpretações capciosas, explorando seus sentimentos e suas paixões para se manterem no poder. 7. Monarquia, em que o agente assumia o Poder por direito hereditário. 8. República, em que o chefe de Estado era escolhido pelo voto dos seus concidadãos, em pleito livre e honesto.

Mas, no meio de todas essas formas de governo, surgiu na Grécia, também, a chamada “cleptocracia” – governo de ladrões.

Efetivamente havia algumas ilhas em que um grupo audacioso assumia o Poder, através da violência, ou da astúcia, instituindo, sem dó nem piedade, uma verdadeira república de ladrões. Roubava-se descaradamente, dia e noite, em todos os dias da semana, inclusive aos sábados, domingos e feriados. O roubo era instituição oficial e o dinheiro dos impostos todo desviado para os detentores do Poder.

Esse exemplo grego foi adotado e implantado em vários países do mundo, em diferentes épocas da História. Vale relembrar o exemplo das ilhas do Caribe, aqui na América Central. Muitas delas eram invadidas e dominadas por piratas, saqueadores e bandidos, que organizavam ali sua base e seu governo. Assim, ficou famosa a chamada Ilha de Tortuga. Todos os navios que passavam em suas redondezas eram aprisionados e tinham seus bens “confiscados” em favor da “república”. O governo só era constituído de cleptocratas. Aqueles que não se adaptassem e continuassem rigorosamente honestos eram mortos sumariamente, ou expulsos do território nacional.

O banditismo, comumente chamado de “crime organizado”, chegou a dominar inúmeros Estados. O primeiro combate sistemático e metódico a essa verdadeira chaga cancerosa que há séculos assola a humanidade, foi desencadeado por Catarina II, da Rússia, que impos pertinaz guerra aos cossacos e tártaros, “os bandidos cristãos e os bandidos muçulmanos”, conforme menciona Rambaud. A Grécia ficou conhecida como “a terra clássica dos malfeitores”. A Itália nunca deixou de lutar contra o banditismo da Calábria e da Sicília. A França sofreu sob a pressão do crime organizado na Argélia e na Córsega. E nem mesmo os Estados Unidos ficaram isentos – basta citar-se a perniciosa atividade da máfia de Chicago nas primeiras décadas deste século, e que sobrevive até hoje, cada vez mais poderosa, com seus tentáculos extendidos por todo o País.

Analisando-se os registros históricos haveremos de verificar que, na realidade, após muitas idas e vindas, voltas e revoltas, os regimes autenticamente democráticos só vieram a existir, neste turbulento globo terráqueo, a partir da segunda guerra mundial.

Sim. Em 1945, com a derrota da filosofia nazi-fascista, soprou no mundo uma brisa de paz, compreensão e harmonia. Nada de guerras, nada de ditaduras, nada de banditismo. O povo estava cansado de arbítrios, tripúdios, e, sobretudo de bombas matando pobres e pacíficos cidadãos e destruindo suas casas.

Sob inspiração de Rui Barbosa foram criados os Tribunais de Contas, para o controle externo das contas públicas, acabando-se definitivamente a possibilidade de fraudes e peculatos.

Graças a Deus, a partir do impulso do imortal baiano, nossos legisladores constituintes de 1988 souberam implantar no nosso país uma pura e autêntica democracia, deixando de lado os nefastos exemplos de ditaduras, oclocracias, cleptocracias, etc., que hoje, felizmente, não passam de mera reminiscência histórica.

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