Dos sem-direitos

No começo deste século o trabalhador brasileiro não gozava de direito algum perante a Lei. Conhecia apenas a obrigação de produzir para seus patrões, que lhes pagavam o que bem quisessem e entendessem.

Foi a partir de 1920, pode-se dizer, que começaram os grandes movimentos reivindicatórios, exigindo salário mínimo, jornada de oito horas, repouso semanal remunerado, horas extras, férias anuais, previdência social, indenização por tempo de serviço e tantas outras novidades que já existiam em quase todos os países do mundo civilizado.

Houve, naturalmente, forte reação dos empregadores, que, como não poderia deixar de ser, foram apoiados incondicionalmente pelo Governo. Os mais intransigentes devem ter sido Arthur Bernardes e Washington Luis.

Washington Luis foi o autor da célebra frase: “A questão social é questão de Polícia”. E contam que teria falado para o Chefe de Polícia do Rio, naquela época Capital da República: “Mande prender esses grevistas agitadores; desça-lhes o pau; ensina-lhes a verdadeira democracia”.

Devido ao seu radicalismo, negando-se a qualquer tipo de diálogo com operários e líderes sindicais, acabou deposto por Getúlio Vargas na chamada Revolução de 1930. Na realidade não houve revolução de espécie alguma, não passando tudo de mero golpe de Estado das guarnições militares do Rio, sem qualquer resistência. Mesmo assim, da mesma forma como em 1964, autodesignou-se como revolução, por ser, sem dúvida alguma, título mais nobre e pomposo.

Getúlio, objetivando aplacar as classes operárias, deu início à legislação social. O país deve a ele a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a instituição do sistema previdenciário.

Desde então os direitos trabalhistas foram se ampliando gradativamente. Apesar de avanços e recuos, não se pode deixar de reconhecer que houve considerável progresso, colocando-se o Brasil, hoje, ao lado da Argentina, como um dos países de legislação social das mais avançadas do mundo, superado apenas pelos da área socialista.

Há algo, no entanto, que não deveria ser esquecido. Nada disso foi dado de presente nem tampouco caiu como dádiva dos céus. Foram direitos conquistados à custa de imensos sacrifícios. Só duma feita, na famosa greve de 1922, em São Paulo, tombaram, metralhados pela Polícia, centenas de trabalhadores. Milhares de pobres e humildes operários permaneceram no fundo das prisões durante muitos e muitos anos. Isso tudo faz parte da História do Brasil.

Esta é a razão por que, na quadra atual, impõe-se muita sensibilidade e bom senso, para que se evitem maiores retrocessos. A imprudência e incapacidade para compreender a gravidade do problema só têm ocasionado dramas e aflições.

Ainda agora a imprensa anuncia dados espantosos acerca de número cada vez maior de desempregados – já orçados em milhões. Mas as estatísticas oficiais só consideram desempregado aquele que era empregado e foi despedido. Por isso não são contados nesse número os que nunca trabalharam e estão procurando emprego. Como se calcula que há cerca de dois milhões de pessoas ingressando anualmente no mercado de trabalho, essas pessoas, naturalmente, deveriam ser adicionadas às demais.

Vemos assim que, a continuarmos nessa marcha, dentro de pouco tempo a maior classe social do País estará constituída dos desempregados. Serão milhões. Não obstante uma legislação trabalhista e previdenciária avançadíssima, teremos perambulando pelas ruas homens sem direito algum, porque no caso inexiste o fato gerador dos direitos do trabalhador: o contrato de trabalho.

E o pior de tudo é que os desempregados não podem sequer fazer greve.

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