Imitação necessária

O Globo noticiava em 7 de dezembro de 1949: “A vida e a tranquilidade do carioca continuam a valer muito pouco. Em cada esquina, principalmente na hora e nos locais onde os socorros são mais difíceis, os malfeitores que infestam a cidade, com uma audácia até então para nós desconhecidas, detêm, ante a ameaça dos revólveres, os transeuntes, extorquindo-lhes os bens, quando não cometem atos ainda piores, arrastando mulheres para lugares ermos, onde as submetem aos maiores vexames. Ante a onda de violência, O Globo tem promovido “batidas” pela cidade que já levaram a polícia a deter cerca de cem delinquentes. A propósito da onda de assaltos que infesta a cidade, o general Lima e Câmara, chefe de polícia, disse que é preciso aumentar o número de carros da radiopatrulha e também que o ideal seria a unificação das atuais polícias sob uma só orientação”.

Volto a repetir, para que não se ache que houve erro de imprensa: isso foi publicado no dia 7 de dezembro de mil novecentos e quarenta e nove.

Conclui-se, portanto, sem muita dificuldade, que o problema da criminalidade é bem antigo, e já há muitos anos vem atormentando o espírito dos nossos homens públicos e legisladores.

Para combater essa terrível praga, a experiência histórica tem indicado diversas causas e apontado as mais variadas soluções. Se não vejamos:

  1. A questão social. Está mais do que provado e comprovado que os mais baixos índices de criminalidade do mundo estão nas regiões habitadas por uma sociedade mais ou menos equilibrada. Por outro lado, as taxas mais elevadas são características de forte desequilíbrio social.
  1. A ameaça de prisão intimida muito mais do que a própria prisão. Isto porque o maior sofrimento do preso é moral. Se o indivíduo já foi preso anteriormente, ou é hóspede habitual das cadeias, fica anestesiado moralmente, pouco ligando para uma condenação a mais ou a menos .

Daí, é ponto pacífico na criminologia moderna, que a prisão deve ser o último recurso a ser adotado pela Justiça penal.

Dentro dessa linha de raciocínio, lá nos Estados Unidos, onde vive um povo eminentemente objetivo e prático, o Juiz, antes de decretar a prisão, e, para reconhecer ao réu o direito de se defender solto, costuma arbitrar fianças proporcionais às suas posses e à gravidade do crime.

Nos chamados crimes do colarinho branco, nos estelionatos em que estão envolvidas vultosas importâncias, nos contrabandos e falcatruas em geral, se o indivíduo se apropriou, digamos, de 2, 3 milhões de dólares, o Juiz arbitra pesada fiança. O cidadão é obrigado a desovar um pouco do muito que possui. E o faz prazerosamente, para evitar a cadeia.

Geralmente o acusado, acostumado a uma vida burguesa, a gozar dos confortos e regalias que só o dinheiro pode dar, e, sobretudo, para evitar a humilhação de ficar enjaulado, arranja, às suas próprias custas, ou com a ajuda de familiares, amigos, compadres e comparsas, aquela montanha de dinheiro arbitrada.

Isso nos vem à memória quando vemos o que se passa no nosso País. Aqui o Estado mandou agentes da Polícia Federal ao redor do mundo para prender P.C. Farias, acusado de trambicagens que iam a milhões ou bilhões de dólares. Depois de gastos imensos, P.C. voltou algemado. Ficou preso por algum tempo, quando acabou morto misteriosamente.

No final da história o prejuízo causado por ele aos cofres públicos, em vez de diminuir, aumentou, graças às passagens, diárias e despesas para a captura, onde estiveram envolvidos dezenas de agentes.

Ainda recentissimamente o Senador Luis Estevão, cassado pelo Senado e caçado pela Polícia, ficou 24 horas preso, de onde saiu lépido e fagueiro, sem reembolsar o Estado num ceitil sequer dos danos causados. Suas únicas despesas foram com os advogados.

Seria o caso de se perguntar: se vivemos num País onde se procura imitar os americanos em tudo, a partir da fabricação de sanduíches e picolés, por que não imitá-los também na cobrança de vultosas fianças a tais espécies de acusados?

Aliás, já dizia Paulo Bonfim que “hoje em dia as pessoas nascem, vivem e amam por imitação”.

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