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Na doutrina constitucional há os países “organizados” e os “desorganizados”. Países desorganizados são aquelas colônias sujeitas ao domínio estrangeiro, nas quais o próprio Governo é nomeado ou indicado pelo Estado soberano integral. Hoje em dia podemos citar, por exemplo, Porto Rico, Gibraltar, Malta, Córsega, etc.

Os países “organizados”, por sua vez, têm ampla autonomia – apenas os elementos básicos e essenciais de sua Constituição (especialmente no que se refere às Relações Exteriores) só podem ser alterados com o consentimento do Estado integral. Por exemplo, Irlanda, Escócia, País de Gales ficam numa dependência de tal natureza com a Inglaterra, que caracteriza plenamente a “soberania limitada” ou “fragmentada”.

Por outro lado, entende-se como nação um conjunto de pessoas vivendo habitualmente no mesmo território, com os mesmos costumes, as mesmas tradições, as mesmas origens, tendo, em resumo, laços culturais, e aspirações comuns.

Há na história da humanidade o exemplo do povo judeu, que durante muitos séculos viveu espalhado por todos os quadrantes do mundo. Conservou, entretanto, o respeito às suas origens e suas tradições, a língua, a religião, a raça e os ideais, mantendo-se como nação, até constituir novamente, em 1948, o Estado de Israel.

Isso serve para confirmar as palavras de Renan, quando dizia que “uma nação é uma alma, um princípio espiritual. Duas coisas que na verdade não fazem senão uma, constituem esta alma: uma é a posse, em comum, dum rico legado de recordações; a outra é o consentimento atual, o desejo de viver juntos, a vontade de continuar a fazer valer a herança recebida individida; ter glórias comuns no passado, uma vontade comum no presente; ter feito grandes coisas juntos, querer fazê-las ainda, eis aí a condição essencial para ser um povo. Uma grande associação de homens, sã de espírito e de calor no coração, cria uma consciência moral que se chama nação”.

Esse caráter espiritual é o fator mais importante para a existência de uma Nação. Muito embora importante, não seria fundamental a identidade de língua, de raça, de religião, de usos e costumes, porque há povos que mantêm a nacionalidade, apesar da diversidade de língua, de hábitos, de religião e de raça, como se ve na Suíça, Espanha, Bélgica e sobretudo nas áreas abrangidas pela extinta União das Repúblicas Soviéticas.

Mas, via de regra, o Estado se forma sobre uma população homogênea, tomando os limites nacionais e culturais criados por sua “consciência histórica”. A nação precede o Estado.

Antes de existir o Estado com sua ordem jurídica, a Nação já possuía seus ordenamentos jurídicos próprios.

Dentro dessa concepção de conservar seus valores históricos, a Constituição vigente mostra obsessiva preocupação na defesa do patrimônio público e social, do meio ambiente e de “outros interesses difusos”, especialmente a moralidade pública, e nesse sentido entrega os mais amplos poderes ao Ministério Público para a tutela e proteção desses bens. Mas, parece que dando uma demonstração de desconfiança na aptidão ou pelo menos na vigilância desse e dos demais órgãos do Estado para policiar o próprio Estado, amplia os poderes de “qualquer homem do povo” para essa atividade fiscalizadora e intervencionista.

Foi daí que, ao lado dos amplos poderes conferidos ao Ministério Público, a Constituição ampliou, também, os casos de admissibilidade da Ação Popular, que, infelizmente, tem sido muito pouco adotada em nosso País.

Talvez seja essa a verdadeira razão desse indiferentismo tão violentamente criticado por Rui Barbosa: o cidadão que trabalha dia e noite para sustentar sua família, pagar impostos para manter a máquina burocrática do Estado, ainda tem que constituir advogado para propor “ação popular” em defesa dos interesses da sociedade, devido à omissão do Estado.

No Estado moderno, muito mais importante e eficaz do que esse direito de ação popular (resquício do direito de petição dos seculos passados), é a ampla publicidade, são as críticas da imprensa, a difusão da imoralidade pelos jornais, rádios e, sobretudo, pela televisão.

E, acrescente-se, a ação popular sem essa divulgação, pouco ou nenhum efeito produzirá. Isso é o que o povo sente silenciosamente, indefinivelmente.

É diante dessa série de raciocínios que ficamos temerosos e apreensivos com a tramitação, no Congresso Nacional, da chamada “Lei da Mordaça”, que significará, sem dúvida alguma, pavoroso retrocesso em nossas instituições, retardando, até mesmo, nosso desenvolvimento cultural.

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