Da corrupção eleitoral

A corrupção eleitoral já era praticada, criticada e combatida nas democracias mais antigas da História da Humanidade. Efetivamente, relata Mommsen, o grande historiador alemão, em sua antológica obra, “História de Roma”, que havia, no Império Romano, uma “notável tendência para se captarem as simpatias dos eleitores a troco de todos os meios e processos”. E que “introduziu-se também pouco a pouco entre os edís e os pretores o costume de captar o favor das massas populares por meios materiais. Prodigalidades enormes nos jogos e espetáculos públicos e nas festas provincianas, uma verdadeira inundação de cereaes por preços tão baixos que eram quase irrisórios, chegando muitas vezes a serem distribuídos gratuitamente, foram então moeda corrente e deram azo à depravação do povo, sempre ávido de divertimentos. Acentua mais que, “finalmente apareceu o pior de todos os inconvenientes, qual foi a tendência de se comprar o voto dos eleitores”.

E acrescenta Mommsen: “Mas não era só a demagogia que servia para obter os votos da plebe, pondo de lado o patriotismo. Havia uma corrupção generalizada para atrair os seus favores: o antigo empenho dos magistrados, e particularmente dos edis, para manterem os cereais a preços baixos e superintenderem os jogos, começou a degenerar e produziu, no fim, a horrível prática para atrair votos: pão gratuito e divertimentos em abundância”.

Gaio Flaminio, o primeiro demagogo romano de profissão, notabilizou-se através dos sucessivos “jogos plebeus” e da “festa em honra da colheita”.

Usava-se a política chamada de “pão e circo” (panes et circens), fazendo com que Catão dissesse que ninguém devia se surpreender com essa maravilha, que “os cidadãos não acolhiam os bons conselhos, porque o ventre não tinha ouvidos” (História de Roma, vol. II, pág. 433).

Nos Estados Unidos, no decorrer do século 19, ficou famosa a decisiva influência do “Tammany Hall” nas campanhas eleitorais, derramando dinheiro copiosamente para a eleição dos seus candidatos, quase todos ricos e aventureiros de toda espécie. E, na primeira metade deste século 20, Al Capone e sua quadrilha lançavam seus candidatos, ou apoiavam alguns “inocentes úteis” com dinheiro a rodo, usando extorsão, sequestro e violências em geral (inclusive homicídios), para elegerem “seus homens” e ficarem manipulando municípios e Estados.

Aqui no nosso País, entretanto, não se pode dizer que nossa democracia ficou para trás. Em todos os pleitos – federais, estaduais ou municipais – abundam as apresentações de Tiririca e inúmeros outros artistas, desfiles de escolas de samba, shows de conjuntos roqueiros, certames, exibições pirotécnicas, sorteios de bonecas, geladeiras, máquinas de passar roupa, bicicletas, distribuição de balas às crianças (e aos pais das crianças), etc.

Na última eleição houve, também, farta distribuição de cestas básicas, galinhas, patos, perus, pintos, ovos, leite e outros gêneros alimentícios.

Agora, felizmente, esse terrível problema vem de ser enfrentado com vigor e energia pelos nossos legisladores. Tanto assim que acaba de ser promulgada a Lei 9.840, de 28 de setembro último, que pune rigorosamente o candidato que “doar, oferecer, prometer ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil e cinquenta UFIRs, e cassação do registro ou do diploma”.

Trata-se, como se vê, de medida altamente moralizadora. Tanto assim que a matéria, oriunda da iniciativa popular, sob a esclarecida liderança da OAB, CNBB e outras instituições semelhantes, foi aprovada por unanimidade pelos nossos Parlamentares, numa tramitação velocíssima.

Essa lei, patriótica por excelência, vem, sem dúvida alguma, acabar, definitivamente, com a corrupção eleitoral no nosso País, instituindo, afinal, uma autêntica e verdadeira democracia.

Aliás, já estava bem na hora de se retificar os conceitos de Rui, quando dizia que “a democracia não existe entre nós senão nominalmente, porque as forças populares, pela incapacidade relativa em que as coloca a ausência de sistema de educação nacional, estão de fato excluídas do governo”.

Pois, se naquela época se exigiria uma ampla reforma educacional, hoje, felizmente, basta um simples artigo de lei.

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