O caso Pinochet

Todo mundo vem acompanhando, com interesse, o que está se passando com o ex-Presidente Pinochet, do Chile, que se encontra preso, atualmente, na Inglaterra, por ordem de um Juiz espanhol.

De fato, não se trata de um Desembargador, nem tampouco de um Ministro. Mas, tão-só e simplesmente de um Juiz de Direito da Espanha.

Esse Juiz, recebeu denúncia que o Sr. Pinochet, durante o período em que exerceu o cargo de Presidente do Chile, através de um golpe militar, ficou investido de poderes ditatoriais, e, como Senhor absoluto, tornou-se responsável por inúmeros homicídios cometidos contra cidadãos espanhóis, no período que vai de 1973 até 1990, quando se restabeleceu a democracia naquele País.

Independentemente de qualquer formalidade, o Juiz espanhol despachou uma ordem para o Juiz inglês, determinando a prisão do Sr. Pinochet e seu envio para a Espanha, a fim de ser interrogado. Além disso, determinou o sequestro de toda e qualquer quantia, e bens, que o acusado possúa na Inglaterra ou em qualquer País europeu.

Sem entrar no mérito da questão, ou seja, sem analisar se houve, ou não, os referidos crimes, e se o Sr. Pinochet seria, ou não, responsável, o fato, para nós, brasileiros, não deixa de ser surpreendente. Não apenas pelo fato de não serem crimes cometidos na Espanha, nem na Inglaterra.

O que há de mais extraordinário para nós, brasileiros, é que, na forma do Direito vigente em nosso País, tudo isso seria absolutamente impossível.

Se não, vejamos:

Em primeiro lugar, um Juiz brasileiro não pode dirigir-se a um Juiz estrangeiro. Para isso existe aquilo que se chama de “Carta Rogatória”.

O Juiz brasileiro que quiser citar ou expedir qualquer mandado contra alguém que resida ou esteja no estrangeiro, deve encaminhar um expediente ao Ministério da Justiça, explicando os motivos e fundamentos da citação. O Sr. Ministro da Justiça, examinando todas as peças do processo (que lhe serão encaminhadas por cópia), decidirá se deve dar encaminhamento ao pedido, ou não. Uma vez aprovado o pedido, encaminhará o processo ao Ministério das Relações Exteriores. Lá, o processo será traduzido para a língua inglesa, ou para a língua do respectivo país onde deverá ser feita a citação. O Ministério verificará, também, acerca das implicações diplomáticas, dos Tratados e Convenções com aquele País, e sobre a conveniência de ser expedida essa rogatória.

Ultrapassada essa fase, o Ministério das Relações Exteriores encaminhará o pedido ao Supremo Tribunal Federal, a quem competirá, finalmente, examinar a autenticidade dos documentos, a legalidade e legitimidade do pedido (aspectos formais) e, só então, decidirá pelo deferimento ou indeferimento do pedido formulado pelo Juiz.

Finalmente, cumpridas todas essas formalidades, segue a Carta Rogatória para o outro País, seja ele europeu, africano, asiático, ou sul-americano – talvez nosso vizinho de fronteira.

Mas essa Carta Rogatória não é despachada para o Juiz respectivo. Absolutamente. Daqui vai para a Embaixada do Brasil naquele País, que a entregará ao Ministério das Relações Exteriores, que, por sua vez, a destinará para a Suprema Corte local, e de lá para o Juiz a quem for distribuído o processo.

Nota-se, portanto, uma diferença espantosa entre o nosso Direito e o Direito vigente entre os países europeus. Lá, o direito é objetivo, prático, material. Aqui, nosso Direito é, antes de tudo, processual, cheio de ritos e formalidades.

Acontece que o excesso de ritos e formalidades culmina por matar o próprio Direito. Tantos são os recursos possíveis e admissíveis, tantas as instâncias e graus de jurisdição que mesmo aqueles que dispõem de recursos para pagar Advogados e custas, acabam desistindo.

Esta a razão por que entendemos, que a primeira tarefa para se implantar uma verdadeira reforma do Judiciário neste País é, sem dúvida alguma, simplificar o processo e diminuir o número de recursos. Fora disso, estaremos reformando para que as coisas continuem as mesmas.

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