O exemplo de Tales

O famoso filósofo grego Tales Examyas, conhecido como Tales de Mileto, sua terra natal, (um dos sete sábios da antiga filosofia grega) viveu entre os anos 624 e 545 antes de Cristo. Pelos escritos de Aristóteles sabe-se que foi um homem eminentemente prático. Consta que esteve no Egito e na Babilônia, onde adquiriu vastos conhecimentos de geometria e astronomia. Graças a esses conhecimentos previu o eclipse total do sol do ano 584 A.C., que pôs fim à guerra entre os Medos e os Lídios.

Dizem as crônicas que Tales, uma vez, profundamente preocupado com o Universo, saiu pela rua, numa noite estrelada, com os olhos fincados no céu, olhando concentradamente para a Ursa Maior. Sua concentração era tão grande que acabou caindo num enorme buraco que estava à sua frente – quebrou as pernas, além de sofrer inúmeras escoriações, ficando aleijado para sempre.

Em resumo: sua imensa preocupação com o que se passava na vastidão do Universo impediu-o de ver sequer a terra onde pisava.

Esse interessante exemplo histórico nos vem à memória quando tomamos conhecimento dos fantásticos planos anunciados pelo Governo Federal para acabar com a criminalidade no País: criação de mil vagas para a Polícia Federal e de 20 delegacias; criação de 15 mil vagas em presídios este ano; reaparelhamento de distritos policiais, após remoção de presos condenados; treinamento de 50 mil policiais federais, civis e militares; ampliação e integração dos sistemas de informações criminais do País; encaminhamento dos projetos Promotec e Pró-Amazônia, de reaparelhamento da Polícia Federal; construção de unidades para adolescentes infratores; criação do Observatório Nacional de Segurança Pública, para identificação e divulgação de práticas antiviolência; aumento do patrulhamento nas estradas, por sistemas de informações e monitoramento de veículos; maior controle sobre armas no País e combate ao tráfico de armamentos.

E mais: estímulo a projetos de resolução informal de conflitos e projetos sociais em áreas metropolitanas com alto índice de homicídios; reforma legislativa para aprimorar o sistema criminal; estímulo a programas de integração da ação policial e de policiamento comunitário.

Enquanto isso a imprensa noticia que “a estagnação econômica cria desempregados crônicos no País”. Ainda recentemente o conceituado jornal “Estado de São Paulo” (18.2.2000), em extensa reportagem comenta que “os mais de 1,5 milhão de desempregados da Grande São Paulo já demoram mais de um ano, em média, procurando uma nova ocupação”.

Cita pesquisa do Dieese, segundo a qual houve aumento no índice de desemprego, de 17,5% da força de trabalho para 17,7%, terminando por observar que “economistas das instituições suspeitam que o Brasil tenha produzido um personagem que é clássico em economias que sofrem longo período de baixo crescimento: o “desempregado crônico”.

O tempo médio de procura por trabalho saltou de 49 semanas para exatas 54 semanas (um ano e duas semanas), portanto um récorde na história da pesquisa. E conclui: “em relação ao ano passado, esse tempo ampliou-se em 17 semanas”.

Anunciou-se amplamente, também, neste princípio de ano, que em 1999 tivemos um aumento do PIB de cerca de 0,75%, o que, em poucas palavras significa retrocesso, porque, considerando-se o aumento populacional da ordem de 2 a 3% ao ano e a enorme camada da população vivendo na mais negra miséria, e necessitando, portanto, melhorar suas condições de vida, para progredir necessitaríamos de um aumento do PIB de pelo menos cinco por cento ao ano.

Já está mais do que provado nas pesquisas criminológicas que a maior causa do crime não é a pobreza, mas, sim, a recessão econômica. De fato, o pobre que sempre nasceu e viveu desprovido dos confortos da vida, na maior parte das vezes mostra-se conformado, encontrando refúgio na religião, no carnaval, no futebol ou nos prazeres mais simples que a convivência social oferece. Já aquele acostumado aos bons restaurantes, às viagens, às moradias de luxo, aos automóveis e aviões, envereda com facilidade pelo caminho do crime, para não regredir. Muitas vezes sucida-se, mata ou morre, de armas à mão, porque não quer rebaixar, de forma alguma, seu padrão de vida e de sua família.

Onde o grandioso plano anunciado mostra-se preocupado com essa terrível recessão econômica, e essa ordem social tremendamente injusta em que vivemos? Absolutamente nada.

Bem a propósito vêm as palavras de Almeida Garret: “E eu pergunto aos economistas, políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infância, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?”

Enviar por e-mail Imprimir