Problemas da modernidade

Já está mais do que provado que há, nos homens, uma tendência irresistível à imitação. O exemplo é contagioso. Pode-se observar, sem muita dificuldade, aquilo que dizia Horácio: “Como o riso faz nascer o riso, assim as lágrimas fazem derramar lágrimas; são nossas caras que se entendem. Se quereis que eu chore, começais a chorar vós mesmos” (Horácio).

O riso, as lágrimas, o bocejo, se transmitem com a maior facilidade. Da mesma forma, as crises nervosas, os casos de histeria, podem também se transmitir; todo mundo conhece as epidemias de delírio que são produzidas principalmente por fanáticos religiosos.

Os alienistas já constataram que a epilepsia é suscetível de se produzir por imitação. Da mesma forma já se constatou a imitação contagiosa de neuroses, bem como são comuns os exemplos de loucura transmitida. Por isso é muito importante que as crianças, as meninas e mulheres nervosas, não sejam testemunhas de crises de epilepsia ou de histeria.

Têm-se visto também casos em que o suicídio, como a loucura, se tornem de qualquer maneira contagiosos, onde um primeiro suicídio foi seguido de outros suicídios, cometidos em condições idênticas. Em seu tratado “Higiene da Alma”, Feuchtersleben cita o seguinte fato. Sob o primeiro império, um soldado se matou numa guarita. Em seguida desse suicídio, vários soldados escolheram sucessivamente esta guarita para se matarem; Napoleão fez queimar a guarita, e os suicídios cessaram. Max Simon conta que um trabalhador tendo se pendurado na braçadeira de ferro duma porta, doze de seus companheiros se penduraram no mesmo lugar, e que parou essa epidemia de suicídios, ocultando a porta. Plutarco também cita uma epidemia de suicídios.

As paixões são contagiosas. Nada é mais contagioso do que o medo. A História registra inúmeros exemplos de exércitos tomados dum terror pânico, no fragor da batalha.

Observando esta tendência do homem em imitar o que vê, e em entrar na paixão que é representada diante dele, Bossuet assinalava os perigos daquelas representações teatrais que “põem fogo em toda a platéia e todas as casas”.

Esta comunicação das paixões se produz, com efeito, com uma rapidez estrema nas reuniões de homens, o que levou Bossuet a dizer: “Quem reúne os homens, os agita”. Sob o império duma viva emoção, tornada geral, a loucura tem sido comparada, com muita justiça, a um organismo vivo, cujos indivíduos que a compõem são os membros, tão grande é a solidariedade que os une. Daí esta expressão para pintar o entusiasmo duma reunião de homens: “Estão decididos como um só homem”.

É sobretudo nas crianças que a influência do exemplo se faz sentir. As crianças são muito levadas à imitação. Poder-se-á, desde a mais tenra idade, utilizar esta tendência nos jovens, para fazê-los adquirir as qualidades que lhes serão um dia necessárias.

Para fazer nascer junto aos rapazes o gosto pela vida militar, e junto a uma moça o pelos quefazeres domésticos, basta constantemente dar ao primeiro um traje de soldado, fazê-lo praticar exercícios militares; basta dar à moça uma boneca, objetos domésticos, de fazê-la imitar as ocupações de sua mãe. Esta observação não tinha escapado a Aristóteles: “É preciso diz ele, que os jogos da infância sejam, na maior parte, imitações do que deverá mais tarde ocupá-las seriamente”. “Um rapazinho caminha, fala e faz os mesmos gestos de seu pai. Uma menina, da mesma forma, se verte como sua mãe, anda como ela, fala como ela… Enfim, os filhos imitam os pais em todas as coisas, até em suas faltas, e em seus maus modos, da mesma forma que em seus erros e seus vícios”.

Kant enfatizava que: “O meio experimental da educação moral é o bom exemplo do próprio mestre, porque a imitação é, no homem ainda inculto, a primeira coisa que o leva a admitir regras que ele se faz a si mesmo”.

É diante dessa série de raciocínios, que sociólogos e pensadores dos mais renomados, da época presente, analisam com preocupação essa avalanche de idéias pervertidas e costumes degenerados, atirados a esmo, que se observa diariamente neste alvorecer de novo século e novo milênio.

Bem dizia Cocteau que “os maus costumes são a única coisa que as pessoas emprestam sem refletir”.

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