Questões controvertidas

Se há um tema que tem sido objeto de muita controvérsia, debates e discussões intermináveis no Judiciário, este é, sem dúvida, o que se refere aos planos de saúde.

A esse respeito, vinha correndo na Justiça uma ação – dentre várias outras – acerca da validade de cláusula contratual mediante a qual o Plano de Saúde só se sujeitaria a pagar no máximo trinta dias de internamento do paciente na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) no Hospital.

A parte requereu na Justiça a cobertura integral de todo o período em que esteve ou estava na UTI, considerando que seria nula a cláusula que, criminosamente, obrigaria o paciente, num instante dramático de sua vida, a arcar com despesas enormes, que não dispunha de recursos para enfrentar, sob pena de ser jogado no olho da rua, recebendo, pode-se dizer, uma mera condenação à morte.

Eis que agora o Superior Tribunal de Justiça, através de voto da esclarecida e culta Ministra Nancy Andrighi, vem de dirimir definitivamente a questão, nos seguintes termos:

“Destarte, a cláusula limitativa do período de internação em trinta dias mostra-se exageradamente vantajosa para a ré, desequilibrando o contrato. De fato, restringe suas obrigações decorrentes da avença, caracterizando vantagem exagerada nos termos expressos do parágrafo primeiro do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor. Tendo em vista, ainda, a natureza e o conteúdo do contrato, conclui-se que a prestação de serviços médicos era o objetivo visado pelo autor ao contratar. Assim, a cláusula limitativa do período de internação mostra-se onerosa para o consumidor, tratando-se de cláusula nula de pleno direito, por ser abusiva, colocando o consumidor em desvantagem exagerada, incompatível com a equidade, conforme o art. 51, inciso IV, do mesmo diploma legal”.

E acentua a Ministra:

“Primeiramente, como já ressaltado pelo juízo singular, o contrato em tela é de adesão, daqueles em que há mitigação do poder de barganha da parte economicamente mais frágil, na hipótese, o segurado. Esse apenas aceita as condições estipuladas pelo que detém a posição econômica mais vantajosa, a seguradora.

Essa espécie de contrato necessita da atenção do julgador para o fato de que, estando em condição mais frágil ao contratar, há grande probabilidade de que o segurado não pudesse discordar de cláusula que o desfavorecesse ou, ainda, que não tenha sido informado suficientemente sobre o alcance da exclusão da cobertura”.

E, ainda sob o ponto de vista do Ministro Ruy Rosado de Aguiar, “O segurado é um leigo, que quase sempre desconhece o real significado dos termos, cláusulas e condições constantes dos formulários que lhe são apresentados. Para reconhecer a sua malícia, seria indispensável a prova de que: 1. realmente fora ele informado e esclarecido de todo o conteúdo do contrato de adesão, e, ainda: 2. estivesse ciente das características de sua eventual doença, classificação e efeitos”.

Diz mais a Ministra Nancy Andrighi: “É de se concluir que a cláusula limitadora, in casu, do tempo de internação em UTI, procedimento médico que se tornou o único capaz de garantir a vida do recorrente, atenta contra o objeto do contrato, em si, frustra seu fim, restringindo os efeitos típicos do negócio jurídico, tornando-a inválida.

Note-se, ainda, que além de malferir o fim primordial deste seguro, a cláusula restritiva de cobertura, ora em comento, acarreta desvantagem excessiva ao segurado, pois este celebra o contrato justamente por ser imprevisível a doença que poderá acometê-lo, por recear não ter acesso ao procedimento médico necessário para curar-se, com o intuito, então, de se assegurar contra estes riscos”.

Daí, veio a decisão do STJ:

“Plano de saúde. É abusiva a cláusula que limita o tempo de internação em UTI”.

Numa época, como a atual, em que tantas críticas são endereçadas, quase que diariamente, ao Poder Judiciário, especialmente quando contrariam interesses e ambições dos poderosos, vale a pena ressaltar-se essa importantíssima decisão do Superior Tribunal de Justiça, que proporciona a verdadeira Justiça, no sentido exato da palavra.

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