A luta pelo direito

A Constituição de 1824 não faz qualquer menção a direitos dos trabalhadores, nem a direitos dos funcionários, nem tampouco a direitos sociais, muito menos a aposentadoria de qualquer espécie. Os operários, após trabalharem enquanto possuissem força e energia, quando estivessem alquebrados pela idade ou pelas doenças, tinham que viver às custas de seus filhos e parentes, ou eram constrangidos a recorrer à caridade pública.

Proclamada a República em 15 de novembro de 1889, passou a ser elaborada nova Constituição, que veio a lume em 24 de fevereiro de 1891. Essa Constituição de 1891 inovou, falando pela primeira vez em aposentadoria, passando a preceituar em seu artigo 75 que “a aposentadoria só poderá ser dada aos funcionários públicos em caso de invalidez no serviço da Nação”.

Esse regime jurídico manteve-se até à Revolução de 1930, após a qual foi editada a Constituição de 1934, que mostrou preocupação, unica e exclusivamente, com os funcionários públicos, prescrevendo taxativamente aposentadoria para “os funcionários que atingirem 68 anos de idade” (Art. 170, § 3º).

A Constituição de 1934 previa, também, a aposentadoria, com vencimentos integrais “qualquer que seja o seu tempo de serviço”, no caso de acidente ocorrido no serviço, ou “atacados de doença contagiosa ou incurável” que inabilite o funcionário para o exercício do cargo” (Art. 170, § 6º).

Muito embora omissa no que se refere à aposentadoria dos trabalhadores, a Constituição de 1934, em seu artigo 121, criou os seguintes direitos: proibição de diferença de salário para um mesmo trabalho, por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil; salário mínimo; jornada de trabalho diário “não excedente de 8 horas”; proibição de trabalho a menores de 14 anos; de trabalho noturno a menores de 16 anos; repouso semanal, “de preferência aos domingos”; férias anuais remuneradas; indenização ao trabalhador dispensado sem justa causa; assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante.

A Constituição de 1934 inovou sobretudo na instituição da Previdência Social, “mediante contribuição igual da União, do empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da maternidade e nos casos de acidentes do trabalho ou de morte” (Art. 121, § 1º, h). Não falou, entretanto, na aposentadoria por tempo de serviço, mas mostrou-se atenta para o trabalhador rural, dizendo que “o trabalho agrícola será objeto de regulamentação especial, em que se atenderá, quanto possível, ao disposto neste artigo. Procurar-se-á fixar o homem no campo, cuidar da sua educação rural, e assegurar ao trabalhador nacional a preferência na colonização e aproveitamento das terras públicas” (§ 4º).

A Constituição de 18 de setembro de 1946, em seu artigo 157, concedeu maiores direitos aos trabalhadores, e, no que se refere à aposentadoria, criou a previdência, “mediante contribuição da União, do empregador e do empregado, em favor da maternidade e contra as consequências da doença, da velhice, da invalidez e da morte” (inciso XVI).

Sob a égide da Constituição de 1967, com a emenda de 1969, foram sensivelmente ampliados os direitos do trabalhador, tanto no que se refere ao contrato de trabalho, como à aposentadoria. Isso durante o período da ditadura militar.

Mas, eis que, com a Constituição de 5 de outubro de 1988, atualmente em vigor, embora emendada continuamente, também chamada, na época, de Constituição-cidadã, surgiu a aposentadoria por tempo de serviço. Ou seja: não se considerava, para efeito de aposentadoria, o tempo de contribuições ao Instituto, mas, o tempo de serviço. Beneficiava-se com isso a grande massa de trabalhadores, especialmente da zona rural, que muitas vezes trabalham anos a fio sem carteira assinada e sem qualquer contribuição para o Instituto por parte do empregador. E também os do chamado “trabalho informal”.

Houve aí, sem dúvida alguma, formidável avanço nos direitos dos trabalhadores.

Acontece que, segundo o ditado popular, “alegria de pobre dura pouco”. Tanto assim que a 16 de dezembro de 1998 foi publicada no Diário Oficial da União a Emenda Constitucional nº 20, através da qual os trabalhadores terão aposentadoria, tão-só e exclusivamente, baseada “no tempo de contribuição”.

Essa emenda veio no dorso de uma anunciada “reforma constitucional” que visava, segundo anunciavam seus defensores, ao avanço e aperfeiçoamento das instituições. O que nos faz lembrar Mark Twain, quando dizia que “nada precisa tanto de reforma como os hábitos dos outros”.

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