Da imunidade parlamentar

A Constituição Federal diz em seu artigo 53 que “os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos”.

Aí não se trata de imunidade em sentido estrito, mas, sim, de inviolabilidade também designada por alguns de “imunidade material”.

A imunidade parlamentar é uma prerrogativa concedida ao Deputado, mediante a qual ele só poderá ser processado mediante licença prévia da Casa a que pertence. Costuma ser designada como “obstáculo processual”. Funciona apenas como “obstáculo”, porque não extingue a punibilidade – apenas impede o processo, que não é instaurado, ou, se instaurado, fica suspenso enquanto perdurar o mandato.

Já o mesmo não se dá com a inviolabilidade, que é uma prerrogativa do Parlamento.

Nos casos de crime comum, abre-se o inquérito, que se encaminha ao Poder Judiciário – Juiz ou Tribunal – que, então, solicita licença para instauração do processo.

Entretanto, quando o Deputado, ou Senador, faz um discurso, opina, oferece parecer, dá um voto ou se manifesta sobre quaquer assunto, por escrito ou oralmente, está coberto pela inviolabilidade parlamentar, ou seja, nem sequer será submetido a plenário qualquer pedido para processá-lo.

É um privilégio concedido à instituição a que pertence, isentando-o, portanto, de toda e qualquer responsabilidade civil e criminal.

Conforme leciona Carlos Maximiliano, “a irresponsabilidade limita-se às palavras pronunciadas ou escritas no exercício do mandato, e abrange não só os discursos, pareceres e votos proferidos no edifício de uma das câmaras, como também as opiniões emitidas fora, no desempenho de sua atividade parlamentar”.

Esse entendimento tem sua origem no Bill of Rights, de 1688, em que os ingleses proclamavam: “A liberdade de palavra, de debate e de comportamento no Parlamento não poderá ser objeto de nenhuma persecução, nem ser levada ante nenhum Tribunal, nem a nenhum lugar a não ser no próprio Parlamento”.

Esta matéria foi amplamente discutida quando, em 1968, o Governo militar quis processar e cassar o mandato do Deputado Márcio Moreira Alves, porque havia feito um discurso considerado ofensivo às Forças Armadas.

Solicitada a licença para instaurar-se o processo, o Congresso Nacional, numa demonstração de coerência e respeito aos preceitos constitucionais, negou a licença, entendendo que aí não se tratava de imunidade, mas, sim, de inviolabilidade.

Realmente os Deputados pagaram caro por essa atitude coerente, firme e jurídica, que tomaram. Basta dizer que o Congresso foi sumariamente fechado pelas tropas militares, dezenas de Deputados e Senadores foram presos e cassados, e, além disso, não se pagava mais subsídios, permanecendo todos em jejum financeiro durante dez meses.

Mas, mesmo com essa violenta intervenção à mão armada, juízes e tribunais passaram a entender que o instituto da inviolabilidade perdurava. O Poder Judiciário simplesmente não admitia ações em que se procurava responsabilizar, civil ou criminalmente, parlamentares, pelos chamados crimes de opinião. Agindo com total desassombro, magistrados chegaram a ser cassados ou submetidos a interrogatórios e vexames, por manteram fidelidade aos preceitos constitucionais.

Nesse sentido, temos, do Supremo Tribunal Federal:

– “A inviolabilidade parlamentar alcança, também, o campo da responsabilidade civil (RE 220687, Relator Ministro Carlos Velloso)”.

E, ainda:

– “A imunidade material prevista no art. 29, VIII, da CF (“inviolabilidade dos vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município”) alcança o campo da responsabilidade civil. Com esse entendimento, a Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto por vereador para reformar acórdão proferido pelo Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais em ação de reparação de dano moral”. Precedentes citados: RE 140.867-MS, HC 75.621-PR, RHC 78.026-ES, RE 210.917-RJ.

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